Conheça o forró pé de serra com Guegué Medeiros, um ‘caba do ramo’
Muito utilizada no Nordeste, a expressão “caba” é uma redução da palavra cabra, que nessa região do país substitui o nome da pessoa ou é usada para se referir a alguém como “caba macho”, “caba da peste” ou “caba safado”.
O baterista, percussionista, compositor e produtor paraibano Hermes Medeiros da Silva, 45, conhecido como Guegué Medeiros, é um dos melhores “cabas do ramo” para mostrar o que é o verdadeiro forró pé de serra, tocado com categoria.
Categoria essa promovida pela reunião de excelentes músicos, além dos arranjos escritos pelo pianista Salomão Soares, todos presentes na live do projeto “Ipueira dos Linhares”, que será transmitida no próximo sábado (20), às 20 horas, no canal de Guegué Medeiros no Youtube https://m.youtube.com/channel/UCyYaBhnyTfCeCdzzoodsjTA.
Antes de ser decretada a “fase emergencial” em São Paulo, o Música em Letras entrevistou o paraibano, que há 14 anos mora na cidade, e gravou um vídeo-veja no final do texto-no qual ele convida o internauta para conhecer, através desse espetáculo virtual com repertório de 11 faixas inéditas de artistas diferentes, o que é um autêntico forró tocado por quem é do ramo.
Além de Guegué (bateria e percussão), Danilo Moraes Doratiotto (voz e guitarra), Eraldo Trajano da Silva (baixo), Luiz Gonzaga Trajano (voz e percussão), Olívio de Souza Filho (sanfona), Rafael Paschoalini Arthuso (voz e zabumba) e Salomão Soares (piano) garantem a qualidade musical do show.
Gegué Medeiro começou a tocar bateria com 12 anos e, após ter tocado, entre outros, com o Quinteto da Paraíba, Chico César, Xangai, Ana Cañas, Toninho Ferragutti, Mestre Fubá, e seu tio, o compositor paraibano João de Linhares, completou 33 anos de carreira.
O baterista já dividiu palco e gravou com Moacir Santos (1926-2006), Gilberto Gil, Dominguinhos (1942-2013), Sivuca (1930-2006), Elomar, Ney Matogrosso, Arnaldo Antunes, Luiz Melodia, Lenine, Zeca Baleiro, Seu Jorge, Anastácia, Martinália, Sandra de Sá, Elba Ramalho, Luiza Possi, Nelson Ayres, Filó Machado, Chico Pinheiro, Luciana Alves, Proveta, Maria Alcina, e mais uma galáxia de estrelas.
Leia, a seguir, o que esse experiente artista tem a dizer sobre seu trabalho, a pandemia, o músico no Brasil e o show “Ipueira dos Linhares”, entre outros assuntos.
MÚSICA EM LETRAS-Como você tem enfrentado o período da pandemia com relação ao trabalho?
GUEGUÉ MEDEIROS-Acredito que esse é o período mais difícil que enfrentamos, não só eu, mas a humanidade de forma geral. Estamos há um ano sem trabalho, tendo que nos adaptar a novos formatos…show, aulas, oficinas, gravações, tudo online. Confesso que pra mim é um novo mundo. Sou um músico para quem o “play” alimenta não só a minha casa, mas a minha alma. Mas quando penso que ficar sem tocar é uma coisa quase insuportável, penso nas famílias que estão passando por uma situação muito mais difícil que a nossa, inclusive com perdas de entes queridos.
Você gravou esse show durante a pandemia. O que foi fácil e difícil por conta dessa situação?
Foi uma sensação estranha!.. Estou em casa há um ano, saindo apenas pra coisas essenciais. Então foi uma mistura de alegria em rever os irmãos de som e de medo. Mesmo a gente tomando todos os cuidados possíveis, sempre fica a insegurança. É estranho você ver uma pessoa querida e não poder apertar a mão, dar um “xêro”, um abraço. Mas confesso que tocar com pessoas e não com uma telinha de computador foi de uma alegria imensurável.
Como foi o processo de produção desse show?
Foi um processo leve e prazeroso, apesar do curto prazo. O nosso grupo é muito proativo e assim que soubemos da aprovação do projeto, todos já se colocaram à disposição para ajudar no que fosse necessário. Então criei o roteiro, juntamos composições nossas. Salomão Soares arranjou, a Tuca Martins fez a produção executiva e assim montamos o “Ipueira dos Linhares”.
Qual a razão desse show se chamar “Ipueira dos Linhares”?
Ipueira dos Linhares é o povoado da minha família, que fica no interior da Paraíba. Apesar de nunca ter morado lá, tenho as melhores lembranças da minha infância, dos banhos de açude, do cuscuz feito com o bagaço do milho, das idas ao riacho no lombo do jumento pra pegar água pra encher o pote, da água do pote, da luz do candeeiro e do céu mais lindo que já vi. A gente ia pra lá nas férias, geralmente depois das chuvas, e o cenário era de uma beleza e de uma alegria desse povo que toca o coração de qualquer um. Ao contrário das épocas de seca, que são um sofrimento só. O que sempre me impressionou é que no sertão pode estar uma seca de lascar, mas é só cair um pingo d’água e o verde e a esperança já começam a brotar. Outra coisa que me impressiona por lá é a quantidade de gente com talento pra música…Se o “caba” balançar um pé de algaroba cai sanfoneiro, zabumbeiro, cantador pra tudo que é lado.
Qual o conceito desse trabalho? Como você o define?
O conceito do trabalho é a cultura do forró pé de serra, a partir da visão do matuto de coração e com a cabeça no mundo. O forró pé de serra tá representado no trio pé de serra (sanfona, zabumba e triângulo), e a parte da cabeça “no mundo” fica por conta dos arranjos do pianista Salomão Soares, outro paraibano arretado que tem levado o forró para salas de concerto, o que pra mim é genial.
O que pretende com ele?
Com toda humildade, pretendo afirmar e valorizar a importância do forró pé de serra, entendendo que podemos entrar em qualquer sala de concerto, que o forró é patrimônio brasileiro e que precisa de todo carinho, cuidado e respeito, o que se tem com outros gêneros da música popular brasileira.
Quando e onde “Ipueira dos Linhares” será lançado?
A primeira exibição do show será no sábado, dia 20 de março, através do meu canal do YouTube https://www.youtube.com/c/Guegu%C3%A9Medeiros/featured e também estará disponível na plataforma online do #culturaemcasa. Teremos ainda apresentações no dia 27 de março, no canal do Instituto Brincante, no Youtube; e nos dias 3 e 10 de abril, no canal do Zabumblog no Youtube e novamente em minha página do Facebook.
O que as pessoas devem ter em mente quando assisti-lo?
O pé de serra sem gibão e chapéu de couro, mas com toda essência e alma do sertão nordestino!
Quais são seus projetos futuros?
Estou produzindo um documentário sobre zabumba, que começaremos a gravar em breve, com muita gente bacana falando do instrumento e do forró. E também gravei uma oficina de zabumba que já vai estar disponível pra todo o público.
Tambor é masculino, mas você chama de o zabumba ou de a zabumba? Por quê?
Gramaticalmente, zabumba é um substantivo masculino que significa bombo ou bumbo… Então seria “o” zabumba. Mas tem registro do Mestre Luiz Gonzaga falando que, quando viu o triângulo, encontrou o marido “da” zabumba. Eu sempre me referi ao instrumento como “a” zabumba, mas, depois de ser chamado a atenção (rsrsr) por um grande amigo e mestre zabumbeiro, o Maestro Chiquito (Maestro Paraibano), tenho procurado me referir ao tambor como “o” zabumba. Nem sempre consigo…risos.
Em tempos de isolamento social o forró está sendo bem prejudicado. Que tipos de ações podem ser realizadas, além de shows online para que essa manifestação popular, entre outras, continue sendo levada ao público sem o risco de promover aglomeração?
Meu querido, a situação é bem delicada, pois não tem como ter forró presencial e o povo não se agarrar! Então acredito que, além dos shows online, seria muito importante outras políticas pra ajudar as casas de forró, os trios pé de serra que muitas vezes não conseguem por si só ter acesso a esses editais ou porque muitas vezes não têm um parceiro produtor pra pelo menos inscrever um projeto.
Complete: Ser músico no Brasil é …
Difícil, mas imprescindível!
Durante a pandemia, os músicos do Brasil deveriam ser mais…
Cuidados pelos empresários donos de bandas. Não dá pra largar a galera aí passando necessidade.
Muita coisa melhoraria para o músico brasileiro se…
O mercado fosse mais democrático e todos pudessem ter acesso às produções independentes.
A relação de um instrumentista com seu instrumento é…
Ímpar!
A música é…
Vida.
O forró é…
Cultura.
O forró pé de serra é…
Patrimônio mundial.
A bateria é…
Chão!
No forró, a bateria é…
Como diria o mestre Dominguinhos, convidado.
O zabumba é…
Nordeste
A zabumba é…
Nordeste
No forró, a zabumba é…
O coração
O triângulo é…
O “marido” da zabumba
No forró o triangulo é…
Imprescindível
O pandeiro é…
Brasil
No forró o pandeiro é…
Balanço
Compositor de forró tem de ser…
Apaixonado pelo Nordeste!
Veja, a seguir, o vídeo no qual o artista convida o internauta para assistir ao show “Ipueira de Linhares”