‘Carpe diem’, uma música por dia

A ideia de compor uma música por dia não tem dono, mas é boa e dá frutos para quem compõe as músicas e para quem as interpreta. É ainda uma maneira de traduzir em ação a citação latina “carpe diem”, ou “aproveite o dia”.

No período entre 24 de junho de 1996 e 23 de junho de 1997, o músico Hermeto Pascoal compôs uma música para cada dia do ano. Todas estão registradas no livro “Calendário do som”, que reúne 366 partituras escritas pelo alagoano, liberadas para serem gravadas por qualquer músico do planeta, dispensando o intérprete de pagar direitos autorais sobre a obra.

Em 2000, o contrabaixista Thiago Espírito Santo e o guitarrista Sandro Haick arranjaram e gravaram seis dessas músicas, compostas por Hermeto, com um time de músicos muito bons, entre eles o pianista cubano Pepe Cisneros, o baterista Nenê, a flautista Léa Freire e o saxofonista Vinícius Dorin (1962-1916).

Contudo, as gravações nunca foram lançadas pelo fato de estarem perdidas. No final de 2020 foram recuperadas, em formato MP3, e fazem parte do disco novo de Sandro Haick e Thiago Espírito Santo “Tudo de Bom Sempre”. O primeiro single, “22 de junho”, pode ser ouvido em https://www.youtube.com/watch?v=7RT2D23zsTY.

(Foto: Divulgação)

Atualmente, dois músicos excepcionais, o violonista Maurício Carrilho e o pianista Leandro Braga, estão cada qual fazendo seus anuários musicais.

Essa não é a primeira vez que o violonista se dedica à tarefa diária de compor. Em 2005 realizou o desafio de compor uma música por dia, o que lhe proporcionou uma “experiência muito legal”. Segundo depoimento de Carrilho em sua página do Facebook, ele aprendeu muito com a disciplina de trabalhar todos os dias as ideias de diversos gêneros, dentro do universo do choro.

Mauricio Carrilho (Foto: Arquivo pessoal)

No primeiro dia do ano de 2006, Mauricio Carrilho sentiu a força do hábito arraigado. Durante aquele dia todo músicas e mais músicas passaram por sua cabeça, “pedindo” para que ele fosse escrevê-las no computador.

O compositor resistiu, mas nem tanto. Fez novamente a odisseia em 2009, depois de passar quatro anos “colocando música para dentro”.  Assim, de quatro em quatro anos, Carrilho realiza seus anuários musicais. Este ano, ele produzirá o seu quinto conjunto de composições, depois daqueles realizados em 2005, 2009, 2013 e em 2017.

Contudo, os anuários do artista podem ter mais de 365 ou 366 músicas por ano. Mas não é uma por dia? Sim. No entanto, algumas vezes uma composição se torna complexa e exige mais tempo para ser finalizada. Quando isso acontece, o autor interrompe a composição e passa a fazer outra, mais fácil, de modo a cumprir a meta de uma música por dia. Depois de cumprir a “cota” diária, a composição mais complexa é finalizada,

Você pode acompanhar a empreitada que gera diariamente maxixes, sambas, polcas, tangos, valsas, schottisch e, claro, choros como o choro sambado e o choro clássico em https://www.facebook.com/mauriciolana.carrilho.

Milton Nascimento e Leandro Braga (Foto: Arquivo pessoal)

O pianista Leandro Braga, diz ter copiado a ideia de seu colega de trabalho Mauricio Carrilho, mas ao invés de chamá-la anuário musical, batizou sua empreitada de “área musical”.

O fato é que o artista não deixa por menos e mostra sua enorme musicalidade por meio de composições diárias, como as belas peças “Alma Palestina”, “Para Nise da Silveira”, “Valsa Depois da Chuva”, “Maxixe Cansado”, “Habanera do Méier” e “A porta do Não Retorno”, esta última intitulada assim para lembrar como era chamado o pedaço de praia, em Uidá, no Benin, a última porção de África para onde nunca mais os escravos retornariam.

Para assistir aos vídeos do grande arranjador, pianista e compositor Leandro Braga interpretando suas composições, acesse https://www.facebook.com/leandro.bragaii.

“A prática leva à perfeição” e “O sucesso é constituído por 10% de inspiração e 90% de transpiração” são provérbios famosos e repletos de sentido. Em ambos os casos o legado deixado por esses dois artistas-e certamente por muitos outros que fazem o mesmo, tratando a música com respeito-é incontestavelmente importante para a parte de amealhar os sons e para quem é amigo dela.