88 Shoals amplia carreira de Kiko Zambianchi para o exterior
O Música em Letras entrevistou com exclusividade, por telefone, nesta segunda-feira (11), o cantor, guitarrista e compositor Kiko Zambianchi, 59, que “sem nenhuma pretensão” formou a banda 88 Shoals, com o técnico de rubgy e cantor britânico Gary O.C., também entrevistado para o blog, pelo telefone, de sua casa, em Londres, onde vivencia o primeiro “lockdown” de sua vida.
Embora tenham formado o grupo “sem pretensão”, como dito por Zambianchi, os dois artistas lançam nesta sexta-feira (15) – dia do 32º aniversário de Gary O.C.- a música “Moonlight”, de Kiko Zambianchi com letra em inglês de Gary O.C.. O som chega nas plataformas digitais com o aval e a preciosa colaboração de ninguém mais do que o produtor e empresário norte-americano David Kershenbaum, que também concedeu uma entrevista exclusiva para este blog.
Considerado um Midas no music business, o produtor norte-americano David Kershenbaum já ganhou 75 álbuns internacionais de ouro e platina e seu trabalho rendeu vários Grammys, além de uma indicação ao Oscar. Kershenbaum trabalhou com artistas e grupos de primeira grandeza. Entre eles, Bryan Adams, Cat Stevens, Duran Duran, Tracy Chapman, Peter Frampton, Supertramp, Tori Amos, Joe Jackson, Elkie Brooks e Laura Branigan. A masterização das músicas da banda 88 Shoals ficou por conta de outro mago do som, o também premiadíssimo Joe Bozzi, responsável por realizar masters para álbuns do U2 e do Fleetwood Mac, entre outros.
Leia, as seguir, o que o “hit maker” Kiko Zambianchi, Gary O.C. e David Kershenbaum, disseram sobre o trabalho dessa nova banda integrada por Zambianchi, que não mediu palavras para criticar o atual governo e a situação caótica na qual nos encontramos com relação à produção musical, à pandemia e à atual conjuntura política e cultural do país.
KIKO ZAMBIANCHI
Francisco José Zambianchi, o Kiko Zambianchi, está cansado de, por anos a fio, receber ligações de produtores “geniais”, sugerindo sempre que ele regrave “Primeiros Erros” ou “Rolam as Pedras”, como se essas fossem suas únicas músicas. Este repórter já teve inúmeras possibilidades de ouvir várias músicas inéditas -sempre muito boas e de sua autoria-, interpretadas pelo próprio Kiko Zambianchi, como prova cabal de que ele não é compositor de uma ou duas músicas apenas. Ter isso em mente é o mesmo que achar que Chico Buarque, depois de ter composto “A Banda” e “Construção”, não fez mais nada de relevante. Ou, para não polemizar pelo fato de os dois artistas pertencerem a gêneros musicais diferentes, que Renato Russo (1960-1996) tenha feito apenas “Faroeste Caboclo” e “Tempo Perdido”.
Desgostoso com a situação na qual a palavra inferno serve muito bem para definir as repetidas investidas de produtores municiados com a proposta “mala” de sempre, o artista resolveu mostrar que o seu “caminho é cada manhã”, e que a partir desta sexta-feira (15), com o lançamento de “Moonlight” (veja letra em inglês e a tradução, no final do texto), sua sólida carreira será ampliada no exterior não com “Primeiros Erros” ou com “Rolam as Pedras”, mas como “rolling stones”.
Segundo Zambianchi, o que aconteceu é que ele estava cansado de fazer discos bons, com músicas novas, bem produzidas, bem gravadas e bem masterizadas para depois mostrar para alguns produtores e os caras dizerem: “Ah, legal, mas vamos regravar ‘Primeiros Erros’ e ‘Rolam as Pedras?’. Isso me dava uma puta brochada, porque você sabe, quando a gente sai de um estúdio, com um trabalho novo, a gente sai com um puta tesão de querer tocar aquele trabalho. A maioria das pessoas da imprensa nem ligaram para os meus outros discos. Não deram a mínima atenção. Parecia que eu só tinha feito essas músicas. Sem falar que, atualmente no Brasil, se você não faz funk ou sertanejo, que é só o que está tocando ultimamente, você desaparece.”
Diante desse maçante vai e vem, semelhante ao retratado, em 1993, no filme “Groundhog Day” (“Feitiço do Tempo”), no qual Bill Murray interpreta um personagem que fica preso numa armadilha temporal que o faz reviver o mesmo dia vezes sem fim, Kiko Zambianchi achou uma maneira de romper com o perene “ritornelo” que teimava em recolocar sua carreira e sua criativa produção cristalizadas, num looping infernal. “Sempre quis fazer algumas músicas minhas em inglês, porque achava que elas ficariam melhores nessa língua, mas meu inglês é puro ‘embromation’. Aí, um amigo meu falou que conhecia um cara que cantava, compunha, fazia cover, era técnico e jogador de rugby aqui no Brasil. Uma noite, há uns cinco meses, esse meu amigo trouxe o tal cara, o Gary, aqui em casa [Zambianchi mora em uma casa no bairro do Pacaembu, em São Paulo]. De repente, o cara chegou aqui cantando pra caralho. Isso foi melhorando a cada dia em que fomos nos encontrando, tocando e compondo juntos. A coisa foi ficando tão boa que formamos uma banda, embora não tivéssemos essa pretensão inicialmente”, contou Zambianchi que já compôs com Gary O.C. mais de 20 músicas.
No final de 2019, Kiko Zambianchi apresentou-se em países da Europa e no Japão. Durante a viagem teve as portas abertas e recebeu convites para realizar mais uma série de shows no exterior que deveriam acontecer em julho próximo. Um deles no palácio de Versailles, nos arredores de Paris, mas, por conta da pandemia, todos foram adiados.
“Amei ter tocado na Europa e no Japão. Fui convidado para realizar um show, em um lugar para mais de 10 mil pessoas. Só que com essa história da pandemia tudo foi adiado. Não foram cancelados, vão acontecer, mas em outras datas e locais ainda não divulgados.”
Desde o início do isolamento social, Kiko Zambianchi está em sua casa compondo e sai apenas para fazer comprar emergenciais. “Componho daqui de casa, e o Gary, da casa dele, em Londres. Usamos o ‘GarageBand’ [programa que permite aos usuários criarem música ou podcasting] para trabalhar e nos falamos todos os dias. Geralmente eu faço a parte musical toda, com melodia, arranjo de base, e ele encaixa a letra. Estou trabalhando bastante nesse projeto e curtindo muito. Não vejo a hora de acabar a pandemia e poder voltar a trabalhar presencialmente e fazer shows.”
O que você pensa sobre essa pandemia?
“Culpar o governo por conta da pandemia não dá, né? A culpa que podemos atribuir ao governo é a da atitude, totalmente equivocada, do presidente; o cara mandando todo mundo sair em uma época como essa. Eu vou te dizer uma coisa, não dá.”
Você é bolsonarista?
“Nem bolsonarista nem lulista. Acho que estamos elegendo presidentes bizzarros faz tempo. O que tinham que dizer para o Bolsonaro é que ele ganhou do PT, como eu, você, ou qualquer um poderia ter ganho. Quem tivesse disputado contra o PT, naquele momento, teria sido eleito presidente, porque havia muita gente contra, descobrindo milhões de coisas, entre elas, roubos. Então, não foi mérito exclusivo do Bolsonaro ter ganho a eleição; foi uma opção do povo em tentar alguma outra coisa para enfrentar um pessoal pesado e capaz de tudo. Outra coisa: eu não acredito que artista tem que vestir camisa de político. Artista tem que ficar isento e ao lado do povo. Quem comprou a briga do Lula viu um monte de corrupção; quem comprou a do Bolsonaro está vendo um monte de coisas. A última postagem que coloquei nas redes sociais, em relação à eleição, foi: ‘Nós vamos ter que escolher entre a merda e a bosta’”, disse o artista que só não deixa de vestir a camisa do Santos Futebol Clube, time para o qual torce ferrenhamente.
Se você pudesse falar uma frase para a Regina Duarte e uma para o Bolsonaro, o que você diria?
“Olha, eu achei a entrevista dela [Regina Duarte] bem estranha. É claro que para o cargo que ela ocupa tinha de ter alguém da classe artística, mas acho que não ela. Tinha de pegar alguém com algum projeto, e ela caiu de paraquedas ali, exatamente porque ela comprou a briga e não sabe o que está acontecendo. Não se colocou diante da morte do Aldir Blanc, que era um cara de esquerda…Eu também, como a maioria [dos artistas], já fui de esquerda, fiz campanha da Marta [Suplicy], na época subi no palanque com ela, com o Lula e todos mais. Enfim, acho que deviam ter feito uma triagem melhor e colocado uma pessoa com um projeto, com ideias, e ela [Regina Duarte] não tem um projeto ou ideias e por isso jamais deveria ter aceitado. Para o Bolsonaro, eu diria que ele tem que entender que não foi ele quem ganhou a eleição, foi o PT que perdeu.”
GARY O.C.
O vocalista da banda, Gary O.C., estava no Brasil há sete anos quando teve de retornar para a Inglaterra por conta da pandemia, mas pretende voltar para o país assim que as coisas se normalizarem. Embora se considere um “cara do rock”, o vocalista nunca levou a música muito a sério, “Sempre soube que eu tinha voz e que poderia cantar, porque faço muito cover, mas nunca levei isso muito a sério porque me tornei um jogador, técnico e empresário. Agora, acredito que essa conexão musical que surgiu entre mim e o Kiko pode se tornar um grande trabalho”, disse o vocalista que considera o encontro entre eles uma “coisa universal, muito especial, que acontece apenas uma vez na vida”.
Segundo o inglês, o nome da banda, 88 Shoals, é uma homenagem que o cantor resolveu prestar ao Muscle Shoals Sound Studio, fundado em Sheffield, no Alabama, em 1969, por um grupo de músicos que quiseram criar um estúdio próprio. Empreitada que deu certo, pois pelo afamado estúdio passaram artistas como Etta James (1938-2012), Wilson Pickett (1941-2006), Aretha Franklin (1942-2018), Bono, além de Mick Jagger e Keith Richards, que com o Rolling Stones gravaram “Sticky Fingers” (1971), 11º álbum de estúdio na discografia norte-americana da banda, e o nono na discografia britânica. Outro entre muitos artistas que gravaram nessa lendária casa de registros da arte de amealhar os sons foi Bob Dylan, que gravou no Shoals seu 19º álbum de estúdio, “Slow Train Coming” (1979).
O número 88 que figura no início do nome da nova banda de Kiko Zambianchi e Gary O.C. tem duas razões: uma é fazer referência à forma acústica de uma das paredes que havia no estúdio, que contém em seu formato o número 88. A outra razão, segundo o vocalista que escolheu o nome, é pelo fato de que coincidentemente o número 88 faz menção ao ano em que nasceu, 1988.
O que as pessoas devem ter em mente quando ouvirem o trabalho do 88 Shoals?
“Que não fazemos música por dinheiro, mas para tocar o coração das pessoas, e fazer parte da vida delas, para que elas sintam como se nossas músicas tivessem sido escritas diretamente para elas.”
“Moonligth” e “Box of Stone” foram as duas músicas gravadas no Orra Meu Estúdios, em São Paulo, pela banda 88 Shoals, formada por Kiko Zambianchi (composições, arranjos de base, guitarra e voz), Gary O.C. (composições, letras em inglês e voz), Ney Haddad (contrabaixo elétrico) e Eduardo Escalier (bateria). Na música de estreia, “Moonligth”, o time contou ainda com Paulinho Zambianchi (guitarra), o rei do trombone, o mestre Bocato (nos trombones, arranjos e orquestração), além do pianista e organista André Youssef (órgão Hammond).
Mostradas as duas composições, na gringa, para alguns produtores, nove deles se interessaram em pegar a banda para trabalhar no exterior. Contudo, todos queriam receber uma grana para isso, com exceção de um deles, o “Midas” David Kershenbaum, que fez uma proposta para atuar com o som do grupo e receber uma porcentagem em cima do trabalho vendido. Os caras da 88 Shoals toparam no ato.
ENTREVISTA COM DAVID KERSHENBAUM
Sendo um produtor com tanta experiência, o que você ouviu no som da banda 88 Shoals que aguçou os seus sentidos? O que motivou você a trabalhar com o grupo?
“Eu costumo gravitar em direção a grandes vocais e performances emocionais, e a 88 Shoals tem as duas coisas! Adorei o sentimento da música e senti que existe uma mágica nessa banda. Os vocais do Gary e a melodia da guitarra do Kiko chamaram minha atenção. Eu trabalhei no estúdio Muscle Shoals original e sempre amei as músicas criadas lá. Esses caras acertaram em cheio com o som deles.”
Como preservar a característica de um “hit maker”, como Kiko Zambianchi, em países estrangeiros, sem modificar a música e a poesia que o tornaram famoso no Brasil?
“O Kiko coloca sua marca pessoal em todo seu trabalho e ele obviamente é um grande compositor. A contribuição dele no 88 Shoals é um presente e, na minha opinião, não tem limites nem fronteiras. Tanto ele quanto o Gary e a banda têm trabalhado juntos com um união poderosa, e a integridade da arte do Kiko aparece perfeitamente em todo o trabalho anterior que ele realizou no Brasil e agora também com o 88 Shoals.”
Como você acha que vai será o futuro dessa banda?
“Eu espero que, com a devida exposição da banda, outras pessoas ouçam e sintam o que eu sinto com as músicas deles. Eu estou bem otimista quanto ao impacto e às possibilidades que eles terão!”
Em qual estilo você classificaria a música feita pela 88 Shoals?
“A música deles tem um estilo próprio. Tem vários elementos, desde a influência brasileira do Kiko até os vocais de cantor e compositor do Gary. Tem alguns elementos retrô também, mas eu acho que eles inventaram o próprio som e o próprio estilo, o que é sempre desejável.”
Você tem planos de vir ao Brasil?
“Eu já trabalhei pelo mundo inteiro, mas nunca no Brasil. Tenho certeza que eu adoraria ir ao Brasil e trabalhar com eles pessoalmente. Eu sinto como se já conhecesse o Kiko e o Gary há bastante tempo. É uma relação bem natural e orgânica.”
LINKS
A primeira música do 88 Shoals, “Moonlight”, será lançada a partir das 0h, dessa sexta-feira (15), nas seguintes plataformas digitais: Apple Music, iTunes, TikTok/Resso, Google Play/YouTube, Amazon, Pandora, Deezer, Tidal, Napster, iHeartRadio, ClaroMusica, Saavn, Anghami, KKBox, MediaNet, Instagram/Facebook, e Shazam.
Ouça “Moonlight” em:
https://distrokid.com/hyperfollow/88shoals/moonlight
https://music.apple.com/br/artist/88-shoals/1507427699?l=en
https://open.spotify.com/artist/78iHKMNLQm1cpK6vTgZwEC?si=DQXyOD6rRgau9z4pyLlstw
https://www.deezer.com/en/artist/90921522
Saiba mais sobre a banda em:
https://www.instagram.com/88_shoals/
https://www.facebook.com/88-Shoals-110684680597879/
Leia, a seguir, a letra da música “Moonlight” em inglês e em português.
“Moonlight”, de Kiko Zambianchi e letra em inglês de Gary O.C.
I have many words I need to say
Doesn’t fit into our daily
Conversation
How long will we now, wait to see
Living on, the dark of side
Of our moon
I just want to think of you
Everything I want to do with my time
With all my heart
I just need to have you close
To warm my soul and keep me here, in blissful
Moonlight
Don’t let this eclipse
Take our light
I have many words I need to say
Doesn’t fit into our daily
Conversation
How long will we now wait to see
Living on the dark of side
Of our moon
I just want to think of you
Everything I want to do with my time
With all my heart
I just want have you close
To warm my soul and keep me here in blissful
Moonlight
Moonlight
Let me go
Yer
Let me out now baby
Ill love another baby
Don’t let me go now don’t
Yer
You’ll never know
Gotta let me know
Don’t let this eclipse take my heart
Take my heart
Take my heart
“Luar”
Eu tenho tanta palavras que eu preciso dizer
E que não se encaixam nas nossas
Conversas diárias
Quanto tempo não teremos que esperar para ver
Vivendo no lado escuro
Da nossa lua
Eu só quero pensar em você
É tudo que eu quero fazer com meu tempo
Com todo o meu coração
Eu só preciso te ter por perto
Para aquecer minha alma e me manter aqui
Nesse calmo luar
Não deixe esse eclipse
Levar a nossa luz
Eu tenho tanta palavras que eu preciso dizer
E que não se encaixam nas nossas
Conversas diárias
Quanto tempo não teremos que esperar para ver
Vivendo no lado escuro
Da nossa lua
Eu só quero pensar em você
É tudo que eu quero fazer com meu tempo
Com todo o meu coração
Eu só preciso te ter por perto
Para aquecer minha alma e me manter aqui
Nesse calmo luar
Não deixe esse eclipse
Levar a nossa luz
Luar
Me deixe ir
Yeah
Me deixe sair agora, baby
Eu vou amar alguém, baby
Não me deixe ir agora, não
Yeah
Você nunca vai saber
Você precisa me deixar saber
Não deixe esse eclipse
Levar a nossa luz