A cantora e compositora Joana Duah volta aos palcos fortalecida

Após ter se afastado dos palcos para acompanhar de perto o desenvolvimento de sua filha Valentina, hoje com três anos, a cantora e compositora brasiliense Joana Duah volta a se apresentar com o show Bicho Encantador nesta quarta-feira (26), no Jazz B, em São Paulo, ao lado de dois craques: Salomão Soares, no piano, e Guegué Medeiros, na bateria e percussão.

O Música em Letras esteve no ensaio do trio e, além de entrevistar a artista, gravou dois vídeos com os músicos mostrando parte do que deve acontecer no show, ou seja, músicas bem interpretadas por quem toca e por quem canta (veja vídeos no final do texto).

Joana Braga Santos Duah, 44, nasceu em Brasília e de lá saiu há cerca de 20 anos para estudar em Nova York, onde morou por cinco anos. Voltando para o Brasil, estabeleceu-se no Rio de Janeiro, onde ficou por dez anos, e há cinco reside em São Paulo.

A ideia da artista é gravar o repertório deste show em seu segundo disco. O primeiro, “Dá Licença”, produzido por Cabelo, como é conhecido o produtor João Samuel, foi lançado em 2011. O trabalho de compositora teve início aos 19 anos, quando Joana  participava como vocalista e backing vocal do grupo pop Maskavo Roots. “Em Nova York basicamente cantava músicas brasileiras e colombianas”, disse a cantora que, durante temporada de três meses apresentando-se em uma casa de jazz em Hong Kong,  acrescentou ao repertório músicas cubanas.

A cantora e compositora Joana Duah (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folhapress)

Joana Duah é casada com o guitarrista, violonista, compositor, arranjador e produtor brasiliense Daniel Santiago e com ele teve Valentina. Dos 20 anos de carreira da cantora, os três últimos foram mais dedicados aos cuidados com a filha. Contudo, não se pode dizer que os três anos foram exatamente sabáticos, pois a artista continuou a cantar e produzir, embora com menor intensidade. “Senti nesse período, talvez por estar isolada socialmente, uma criatividade bem pulsante que acabou por me dar uma abertura para que eu ficasse mais em contato comigo.”

Perguntei o que é mais transformador artisticamente quando se é mãe. “Depois que você é mãe, parece que diminui a sua necessidade da aprovação externa. Você tem tanta coisa para resolver. São questões mais importantes, não só de sobrevivência, mas que nos levam a nos reencontrarmos como indivíduos. Porque ser mãe é uma coisa que te dilui, mas depois você se reconstrói. Então, acho que tem uma força artística que veio depois da maternidade”, disse a cantora que estreou o show que fará no Jazz B há quase um ano, em Brasília, além de ter se apresentado também no teatro Brincante, em São Paulo.

Segundo Joana Duah, os primeiros momentos na maternidade são “difíceis pra cacete”. “Na verdade, não fiquei com depressão pós-parto, mas tive o que se chama ‘baby blues’ que é um negócio assim: você está gravida com os hormônios bombando e, de repente, no dia seguinte, além de ter perdido 15 quilos no parto, você vira de cabeça para baixo hormonalmente. Passa a não dormir e a acordar de meia em meia hora. Isso acaba com a cabeça de qualquer ser humano normal. É enlouquecedor. Fala-se muito pouco sobre isso porque se romantiza muito a maternidade”, contou a artista, assegurando também que “há coisas incríveis, no processo de ser mãe, mas foi uma batalha”.

Depois do nascimento de Valentina, Joana realizou alguns shows e deu aulas particulares de canto. Segundo ela, não ter um vínculo empregatício em regime CLT fez com que tivesse “zero respaldo maternidade”. “Sem CLT a gente simplesmente tem que se virar. Se eu fico sem trabalhar, fico sem dinheiro. É uma barra e você depende da ajuda de outras pessoas para conseguir encarar a opção de ser mãe.” Joana é bacharel em artes, pela New School University (Nova York), com concentração em performance. “Como havia cursado um ano de antropologia na Universidade Federal de Brasília, consegui abater algumas disciplinas e fiz o bacharelado em Nova York em três anos.”

Em São Paulo, a artista fez pós-graduação em canção popular na faculdade Santa Marcelina, com Sérgio Molina, de quem também é colega de palco no grupo Música de Montagem. Atualmente, viaja duas vezes para Campinas, onde realiza mestrado em música na Unicamp.

O conselho que a artista dá para quem foi mãe é: “Traga sua cria para vida. Não fique dentro de uma redoma criando um tipo de não realidade em que você se negue como pessoa, porque a gente é mãe, mulher, filha, irmã, profissional, artista, e a gente precisa exercer essas coisas para nossa saúde emocional”. E para os pais: “Aí, cheguem junto, né rapaziada?”

Joana Duah, Guegué Medeiros e Salomão Soares ensaiando para o show (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folhapress)

O SHOW

Esta será a terceira vez que Joana Duah apresentará o show, que leva o nome de uma de suas composições, “Bicho Encantador”, com a compositora brasiliense Milena Tibúrcio. “Essa música fala sobre a morte porque foi uma experiência que tive antes de a Valentina nascer. Tive uma gravidez tubária que não foi detectada a tempo e a consequência desse não diagnóstico foi uma hemorragia interna muito grave e perigosa. Fiquei internada por uma semana na UTI, tive que retirar uma trompa e sofri duas transfusões de sangue. Depois de um tempo, essa experiência de proximidade com a morte deu uma fortalecida na minha relação com a vida e no meu desejo por ela. Acho que a morte redimensiona um pouco a vida e você começa a colocar o que de fato é importante. Se você tem o que dizer, diga. Se você tem um desejo, realize”, contou a compositora sobre a letra que “olha no olho desse ‘bicho encantador’”, expressão criada por Ariano Suassuna (1927-2014) para a morte, em um de seus poemas.

De Joana e seu marido Daniel, “Valentina”, música feita com uma levada pop para a filha figura no repertório do show. “Fiz a letra e Dani, a melodia e arranjo dessa música. Com o trio, ela ganhou um rearranjo pop, mas com uma leveza, pois é uma declaração de amor para nossa filha.”

Outra composição de Joana Duah que está no show é “Vó Lucimar”,  homenagem á vó paraense da cantora. O baião lento “Prá Dar o Bote”, de Joana, também está garantido na apresentação.

De outros compositores há “Gran Circo”, de Milton Nascimento, baseado no arranjo original, mas com algumas modulações; e “Tiro Cruzado”, de Nelson Ângelo e Márcio Borges com a mesma levada pop dançante, “quase um rock”, que foi gravada no primeiro disco de Joana. “Samba Plataforma”, de João Bosco, ganhou uma versão a capela e “Quebradeira de Coco”, de Roque Ferreira, música que acompanha Joana Duah desde 2009, quando a artista fazia temporada no saudoso bar Semente, na Lapa, Rio de Janeiro, também será interpretada.

Da leva dos novos compositores, “Negra” de Iara Ferreira e Luis Barcelos, segundo Joana, trata da relação da descendência negra que muitas vezes é negada por pardos e brancos. “Essa música fala sobre a questão do racismo de uma maneira poética, mas bastante incisiva. A música era um samba lento, mas atualmente virou outra coisa. Tem que ir no show para ver”, disse rindo a artista.

Assista, a seguir, aos vídeos nos quais Joana Duah, Salomão Soares e Guegué Medeiros tocam duas músicas do espetáculo.

SHOW BICHO ENCANTADOR

ARTISTAS Joana Duah (voz), Salomão Soares (piano) e Guegué Medeiros (bateria e percussão)

QUANDO Quarta feira (26), às 21h

ONDE Jazz B, r. General Jardim, 43, República, São Paulo; telefones: de segunda a sexta, das 10h às 18h, (11) 3088-0645 / 9 9559-9751; e de terça a sábado, das 18h às 24h, (11) 3257-4290

QUANTO A partir de R$ 30