Domingueira: Leela lança disco em doses homeopáticas

Domingueira é a série do Música em Letras, em que textos de fôlego são elaborados para uma leitura que exige mais tempo. Neste post há uma entrevista exclusiva com a banda Leela, que está lançando um disco, em doses homeopáticas, pela internet.

O Música em Letras esteve no estúdio de ensaio e gravação da Leela, em São Paulo, gravou duas músicas novas do grupo (veja vídeo no final do texto) e entrevistou seus fundadores e dois de seus integrantes: Rodrigo Brandão e Bianca Jhordão.

Rodrigo O´Reilly Brandão, 44, guitarrista, compositor e produtor musical da banda Leela nasceu em Londres – mais especificamente em Wimbledon –, mas veio com um ano para o Brasil, trazido por seus pais, um casal de cariocas que, com o frio, arregaram e deixaram o país da realeza. “Meu pai foi para a Inglaterra estudar música clássica, tocando contrabaixo. Ele e minha mãe foram para a Inglaterra nos anos 1970 e ficaram amigos dos Rolling Stones. Chegaram a morar com o Mick Taylor [guitarrista que deixou os Stones em 1974]. Minha mãe trabalhava em pubs e aí eu ‘pintei’. A partir daí, eles quiseram preservar o bebezinho, porque já estava muita loucura no mundo do rock. E voltaram para o Brasil no primeiro inverno para me preservarem do frio e da loucura”, contou rindo o artista, que se casou com Bianca Jhordão e há 12 anos moram em São Paulo.

Bianca Jhordão, 41, nasceu “leão, com ascendente em touro e lua em áries”, disse a cantora, compositora e guitarrista do grupo que adora astrologia e que veio ao mundo no bairro de Humaitá, no Rio de Janeiro, mas morou no Flamengo, por muito tempo, antes de ir para Itaipava, na serra fluminense, onde cresceu cercada de árvores, cachorros e hortas. “Sou uma menina minhoca, cresci na terra. Voltei para o Rio e cursei uma faculdade de jornalismo, porque fiquei muito apaixonada por música”, disse a vocalista.

Dos 16 aos 18 anos, Bianca comandou o programa de rock Alternative Mind, na Tribuna FM – 88.5, em Petrópolis, ex-rádio Imperial, de propriedade do príncipe Luiz Philippe de Orléans e Bragança. “Era o ano de 1994 e 1995. Tocava Nirvana, Pearl Jam e todas as bandas grunge do momento. Depois, enquanto cursava a faculdade de jornalismo, no Rio, conheci o Rodrigo, começamos a namorar e montamos uma banda juntos. Abandonei o jornalismo e cursei dois anos do curso de letras na PUC, mas achei que o curso era muito devagar. Estava muito agitada e fui para a área de propaganda e marketing, em que me formei após mais dois anos de curso.”

Bianca Jhordão, vocalista, guitarrista e compositora da banda Leela (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folhapress)

MUDANÇAS

Em 2007, o casal veio para São Paulo gravar o segundo álbum da banda Leela, “Pequenas Caixas” (Arsenal/Universal Music, de 2007) – o primeiro é “Leela” (2004), também conhecido como “Ver o Que Faço”, (Arsenal/EMI) –, e acabou trocando a Cidade Maravilhosa por Sampa.

“Nessa ocasião, um pouco antes de mudarmos, vínhamos muito para cá para divulgar a banda e fazermos shows. No primeiro disco, a gravadora nos colocou em um hotel, durante um mês, e percebemos que um mês de São Paulo era igual a um ano do Rio, em termos do que acontecia e do que agitávamos aqui. Recebemos a proposta do empresário e da gravadora para nos mudarmos para cá e fazermos nossa base aqui, pois tínhamos muita resposta do público local, curtíamos bastante e era uma maneira de viabilizar o lançamento de nosso segundo disco”, contou Rodrigo, que estudou violão ainda no Rio de Janeiro, durante três anos, com Almir Chediak (1950-2003), compositor, violonista e autor de vários songbooks de artistas da MPB, além de livros sobre técnica de improvisação e harmonia funcional.

Rodrigo Brandão, guitarrista e compositor da banda Leela (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folhapress)

AGENDA CHEIA

A banda Leela surge em 2000, antes de ter uma de suas músicas inserida na série “Malhação”, e tocar em programas da Rede Globo, como o do Faustão, além de ganhar prêmios na MTV. “Tínhamos uma projeção boa e tocávamos no Sul, Norte e Nordeste do país”, falou o músico que, em 2018, fez com o grupo apenas dez shows. “Não fizemos muitos shows porque resolvemos nos dedicar a terminar o álbum que estamos lançando, por faixas, nas plataformas digitais”, contou Rodrigo, que ainda não tem o nome do disco, cuja produção teve sua produção interrompida por conta de muito trabalho.

Em 2017, o grupo fazia shows praticamente todos os finais de semana na capital paulista e arredores, além de ter desenvolvido um sistema de transmissão, ao vivo, no estúdio em que montou em uma casa na rua Tupi, no bairro da protetora dos músicos, Santa Cecília, em São Paulo, para veicular o Leela Live, programa semanal no qual se apresentava com amigos músicos, compositores e cantores. A ideia era “levarem um som e tocarmos músicas nossas e dos outros artistas que curtimos”, disse Rodrigo.

Ao produzir e veicular o programa ao vivo, a banda interrompeu a produção do disco, retomada em 2018, culminando em um pré-lançamento, no final do mesmo ano. “No primeiro semestre do ano passado, quase não nos apresentamos para terminarmos o disco, pois a agenda anterior da banda era muito cheia e não deixava tempo para nos dedicarmos a ele. Assim, terminamos e lançamos o disco, no final de 2018, na Casa do Baixo Augusta, dentro da programação da SIM [Semana Internacional da Música]. Também fomos banda residente da Comic Con Experience [evento que cobre as principais áreas da indústria da cultura pop, entre elas, vídeo-games, histórias em quadrinhos, filmes e séries para TV]”, disse o artista.

Guilherme Dourado, baixista da banda Leela (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folhapres)

DESCONECTANDO

Segundo Rodrigo, no conceito do novo disco, que conta com dez músicas, “abordamos as relações pessoais que se dão no universo digital, no mundo das mídias e das redes sociais, pois consideramos que somos, atualmente, metade humanos e metade mídia”. Para tal, Rodrigo e Bianca compuseram a maioria das músicas com o parceiro carioca Fausto Borel Cardoso, conhecido como Fausto Fawcett, 61, cantor, compositor, letrista, escritor, jornalista, ator e roteirista brasileiro. “Fizemos uma música para cada rede, incluindo as nossas redes internas”, contou Rodrigo.

O primeiro single – lançado, em novembro de 2018 – das novas canções é “Youtube Mine”, de Bianca Jhordão, Rodrigo O’Reilly Brandão e Fausto Fawcett, que brinca com o modo de os youtubers se apresentarem e com o narcisismo que há nesse meio. “Às vezes, a pessoa não tem nada para apresentar, mas está ali, na frente da câmera, falando, se expressando, e tem um monte de gente vendo um monte de bobagem”, disse Rodrigo, que lançou, em fevereiro de 2019, “Momento Presente”, dele, Bianca Jhordão, Fausto Fawcett e Andrea Borges para mostrar como somos sugados na rede digital por inúmeros assuntos que nos desviam de nossos reais objetivos. “Às vezes, entramos na rede só para abrirmos um e-mail e, quando percebemos, estamos envolvidos com muitas outras coisas que não têm nada a ver”, falou Rodrigo, seguido por Bianca: “Essa música também fala sobre o momento presente, de polegar para cima e polegar para baixo [curtir e não curtir], um verdadeiro coliseu de ‘likes’ e ‘dislikes’ que nos suga para esse buraco negro. Por isso, precisamos estar conectados com o momento presente. Por exemplo, muitas vezes estamos em um jantar em família, mas estamos cada um conectado ao seu telefone e não no momento presente, olhando no olho para compartilharmos aquele momento. É importante nos desconectarmos para nos conectarmos com momentos da vida real, e não só ficar olhando o que os outros estão fazendo pela rede social”, falou Bianca.

Outras duas músicas já foram lançadas nas plataformas digitais. Em dezembro de 2018 foi ao ar “Fanáticos Online”, de Bianca Jhordão, Rodrigo O’Reilly Brandão e Fausto Fawcett, abordando o universo das redes de gamers. Vale lembrar que Bianca foi apresentadora de um programa na TV, no qual entrevistava especialistas em tecnologias e gamers, enquanto jogava vídeo game.

Outra música, lançada no dia 12 de abril, foi “Cada Vez Mais”, de Bianca Jhordão, Rodrigo O’Reilly Brandão, Fausto Fawcett e Kjell Sandvik. “Ela versa sobre a conexão com o nosso interior, para compreender sobre o que estamos passando, pois se não nos conectarmos com nós mesmos ficamos perdidos”, disse Rodrigo.

Entre as outras composições que serão lançadas em breve estão “Scarfacebook”, abordando o Facebook, além de “Fome de Viver” e “Amor Aplicativo”, sobre os aplicativos de encontro. “Fuga pelo Twiter” é um relato sobre várias pessoas que se unem no mundo underground para organizarem uma fuga pelo Twiter e desaparecerem da sociedade, além de “Lost In You” e “Seven”, de Bianca Jhordão, Rodrigo O’Reilly Brandão, e Kika Seixas, ex-mulher e viúva de Raul Seixas (1945-1989).

Fabiano Paz, baterista da banda Leela (Foto: Carlos Bozzo Junior/ Folhapress)

SHOWS EM SAMPA

Segundo Rodrigo, depois do Carnaval de 2020 o álbum estará completo na rede e será lançado em CD e em LP. “Estamos pensando em lançar o disco físico em CD e em vinil, com arte, encarte e tudo que temos direito”, disse Rodrigo integrante da banda Leela, com Bianca Jhordão desde a sua fundação. Atualmente, a banda ainda conta com os sons de Guilherme Dourado, no contrabaixo e Fabiano Paz, na bateria. “Eu e Rodrigo, além de compormos e tocamos guitarra, cantamos em todas as músicas. Ah, e o Rodrigo também toca sintetizadores”, falou Bianca que também toca teremim, na música “Dirty Jokes”, dela, Rodrigo e Kiko Cabral, ainda a ser lançada.

A banda tem algumas datas confirmadas de shows em São Paulo. Entre elas, no dia 26 de maio, no The Sailor; 6 de junho, no St. Paul’s Pub; 3 de agosto (aniversário de Bianca Jhordão), no Estúdio Aurora; e 5 de setembro, no FFFront, com a presença de Fausto Fawcett. “No dia 5 de setembro, faremos uma apresentação diferente com o Leela e Fausto Fawcett, no FFFront, na Vila Madalena, com ele lendo trechos de alguns dos livros dele”, contou Bianca que, no final dos anos 1990, deu uma entrevista para a TV como integrante da banda Polux, que foi assistida por Fawcett. “Eramos uma banda punk formada por meninas, chamamos o Rodrigo para tocar guitarra conosco e fizemos vários shows pelo Brasil. Em um show que fizemos no MAM, no Rio de Janeiro, organizado pelo poeta Chacal, o Fausto foi e disse que tinha me visto em uma entrevista e tinha gostado de mim que tocava guitarra e era loira, e me convidou para tocar na banda dele”, contou Bianca, que integrou a banda do autor de “Katia Flávia, a Godiva do Irajá” e excursionou com ele, entre 2000 e 2001, apresentando o show “Dallas Melrose” pelo Brasil. A partir daí passaram a compor juntos.

Segundo Bianca, Fausto Fawcett traduz muito bem, em textos, as ideias que têm juntos. “Ele faz um livro de nossas ideias, do que conversamos. Depois, sentamos juntos e criamos tudo, melodia, letra, harmonia e levada”, disse a artista que, após ter se mudado com o marido para São Paulo, aprofundou mais ainda a relação com Fawcett, passando a se encontrarem com mais frequência e a comporem na mesma proporção.

Assista, a seguir, aos vídeos gravados com exclusividade pelo Música em Letras, nos quais a banda Leela interpreta duas músicas, “Cada Vez Mais” e “Momento Presente”, as duas do repertório do novo álbum do grupo.