Conheça e assista Quinta Essentia
Conheça e Assista é a seção do Música em Letras dedicada a perfis de artistas e profissionais relacionados à música. Muitos deles, embora com carreiras estabelecidas e reconhecidas por seus pares, não têm seus nomes identificados imediatamente pelo público.
Mesmo para quem milita na área, como é meu caso, histórias e trajetórias de personagens que contribuem de modo relevante para nosso universo sonoro podem passar despercebidas. Por isso, aproveito para contar aqui como acontecem esses encontros, misto de atenção, acasos felizes, contatos e um pouco de sorte.
Nesse relato, conheça o quarteto de flautas doces Quinta Essentia e seus quatro integrantes, que embarcam para a Alemanha, onde gravam “Caboclo”, o quarto CD do grupo, e farão um concerto no dia 29, em Berlim. Na sequência, seguem para a China, onde se apresentarão, pela segunda vez, no dia 12 de abril.
Assista ao grupo tocando durante ensaio gravado com exclusividade pelo Música em Letras (veja vídeos no final do texto).
PRIMEIRO CONTATO
Conheci a música do Quinta Essentia fuçando na internet. Achei um grupo legitimamente brasileiro, com sólida carreira, indo para o quarto disco e com músicos dedicadíssimos à arte de amealhar o som, que é superbem trabalhado, estudado, bom de ouvir e de ver – flautas quadradas são no mínimo diferentes –, além do gancho: estão indo para Europa gravar, fazer concerto e depois para a China, onde também se apresentarão.
Comuniquei-me com seus integrantes, armamos de nos encontrarmos em um dos ensaios do grupo, que aconteceu no Centro Suzuki de Educação Musical, na Vila Mariana, em São Paulo. O contato pessoal com o grupo acabou por elevar ainda mais minha estima pelo trabalho e pela dedicação “profissa” que seus quatro integrantes têm com relação à música.
Leia, a seguir, a trajetória desses preparados e qualificados artistas que representam não só o Brasil, mas a música feita com qualidade e respeito para o mundo.
GÊNESE
Gustavo Henrique de Francisco, 40, nasceu em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo. Foi ele o porta-voz do Quinta Essentia na entrevista ao Música em Letras, que solicitou aos outros integrantes que respondessem por e-mail a algumas perguntas (veja texto no Quem é Quem no Quinta Essentia).
Flautista, Gustavo de Francisco, como é chamado artisticamente, é compositor, arranjador, professor de música, produtor musical e “mais um pouco”. Nos dois últimos repertórios realizados pelo grupo, “A Arte da Fuga” e “Caboclo”, praticamente todos os arranjos são dele.
Em ‘A Arte da Fuga’, reunindo composições de J. S. Bach (1685-1750), por exemplo, não há instrumentação definida na partitura original. Assim, é necessário que sejam feitas algumas pequenas adaptações para os instrumentos que o grupo utiliza. “Escrevi os arranjos, além disso sou produtor do grupo e cuido, entre outras coisas, de correr atrás de concertos e fazer a assessoria de imprensa, como agora estou fazendo com você”, disse rindo o atarefado músico, que ainda desempenha a função de fotógrafo, além de ser engenheiro eletrônico formado pelo Instituto Mauá de Tecnologia (IMT), em São Caetano do Sul.
O grupo Quinta Essentia surge em 2006. De 2006 a 2011, Gustavo trabalhou nos bancos Unibanco e Itaú como analista de sistemas, durante oito horas por dia. “Eram as oito horas no banco, mais quatro dedicadas ao Quinta Essentia, e quando tirava férias, fazia turnês com o grupo.”
A partir de 2011, o músico passou a se dedicar exclusivamente ao quarteto, além de alimentar o blog quintaessentia.com.br e, há quatro anos, desempenhar a função de professor de flauta doce no Centro Suzuki.
Gustavo é casado com Renata Pereira, 36, também integrante do grupo desde a primeira formação. Pedro de Magalhães Ribeiro Bruno e Francielle da Silva Paixão completam o quarteto na atual formação. “Com a primeira formação, tocamos de 2006 a 2012. Tivemos quatro formações, e o Pedro tocou conosco em 2013 saiu e retornou em 2017, antes de integrar a que nos encontramos e que espero dure muitos anos”, disse Gustavo, reconhecendo ser difícil manter um grupo artístico estável por um longo prazo. “Não é fácil, posso dizer isso financeiramente e humanamente. No início, houve um grande investimento de trabalho e o retorno financeiro para alguns ex-integrantes, talvez, não tenha sido suficiente, o que pode ter provocado a saída deles. Sem falar que havia também outros projetos de vida, além do grupo, para essas pessoas”, explicou o músico sobre as várias situações que promoveram a mudança de integrantes do Quinta Essentia.
ÁLBUNS
“LA MARCA”
O primeiro disco do Quinta Essentia, “La Marca”, esgotado, foi gravado entre 2007 e 2008, segundo Gustavo, com o intuito de mostrar tudo o que seria possível tocar com a flauta doce. “Essa era a ideia inicial. Por isso, o repertório é bem variado, com música renascentista, barroca, popular, brasileira e contemporânea. É um apanhadão de tudo”, contou o músico afirmando que para que um grupo exista há de se ter um trabalho registrado fisicamente. “Isso é muito importante e assim, também com essa finalidade, gravamos esse disco”, disse o artista sobre o CD que traz, entre outras, “Um a Zero” (1946), de Pixinguinha (1897 – 1973); “Sonata 5” (1731), de Joseph Bodin de Boismortier (1689-1755); “Canzona Decima La Feliciana” (1596) e “Canzona Sesta L’Alcenagina” (1596), de Adriano Banchieri (1568 – 1634); e “Concerto em Fá Maior”, de Georg Philipp Telemann (1681-1767), além de “Sonho Novo” (2007), de Julio Bellodi e “Descascando Uva” (2007), de Claudio Menandro. Embora esgotado, o disco pode ser ouvido nas plataformas digitais.
“FALANDO BRASILEIRO”
Entre 2013 e 2014, o Quinta Essentia gravou e lançou o segundo álbum do grupo, “Falando Brasileiro”, fazendo jus ao nome do disco que acolhe músicas brasileiras. “Em 2010, fizemos um projeto, anterior a essa gravação, tocando o mesmo repertório e que teve uma ótima recepção de público e mídia. Por isso, resolvemos gravar”, falou o flautista sobre o disco que tem entre as músicas “Jura” (1928), de Sinhô (1888-1930); “Desafinado” (1963), de Tom Jobim (1927-1994); “Ponta de Areia” (1975), de Milton Nascimento e Fernando Brant (1946-2015); e “Choro pro Zé” (1992), de Guinga, com arranjo de Rafael dos Santos, além de “1ª Suite Infantil” (1944), de Guerra Peixe (1914-1993).
“A ARTE DA FUGA”
Em 2017, surge o terceiro disco do grupo “A Arte da Fuga”, com as 14 fugas e cinco cânones de J. S. Bach, gravados para o selo ARS, em Hamburgo, Alemanha. Entre as faixas de “A Arte da Fuga”, “Contrapunctus 1”, “Contrapunctus 2”, “Contrapunctus 3”, “Contrapunctus 4”, “Canon per augmentationem in Contrario Motu”, “Contrapunctus 12, a 4: rectus”, “Contrapunctus 12, a 4: inversus”, “Canon alla Decima – Contrapunto alla terza”; e “Contrapunctus 13, a 3: rectus”, além de “Canon alla Duodecima in Contrapunto alla Quinta”.
“Esse disco foi um marco, pois estávamos com dez anos de grupo e esse é um repertório que sempre queríamos tocar, inclusive na época em que gravamos o ‘La Marca’ já tocávamos um dos contrapontos do Bach, o ‘Contraponto 9’. Queríamos tocar a obra inteira, mas não tínhamos instrumentos para isso. Eram instrumentos especiais com afinação barroca, com o Lá 415 [Lá 415 é o nome coloquial dado ao som que produz uma vibração a 415 Hz e serve como padrão de referência para a afinação], e todo o consorte barroco [consorte é um conjunto instrumental, composto por instrumentos da mesma família e diferentes tessitura]. Desde a [flauta] grande baixo até a sopranino, e instrumentos especiais como a soprano em si bemol, a contralto em sol, uma tenor em em si bemol, e uma grande baixo em si bemol. Esta última flauta só existem quatro no mundo”, contou o músico que tentou formalizar um pedido para o luthier que havia fabricado, há 30 anos, as quatro relíquias. O artesão não topou a empreitada, pois, além de a construção desse tipo de flauta ser muito complicada, ele não tinha mais condições de fabricá-las e não estava disposto a realizar a tarefa nem por uma alta quantia.
Diante da negativa do artesão, os integrantes do Quinta Essentia foram em busca dessa flauta, pois sem ela não seria possível gravar o CD. Após falarem com inúmeros luthiers, de vários lugares do planeta – que, segundo Gustavo, não são poucos –, acharam um que havia trabalhado na Yamaha, no Japão, que topou realizar a tarefa. “Hiroyuki Takeyama é seu nome e a flauta é da Yamaha, que não produz uma grande baixo em si bemol, com essa afinação específica na qual a nota lá está em 415, mas fizeram o instrumento especialmente para o Quinta Essentia. Essa flauta tem a nota mais grave, um dó, oitava abaixo do dó central”, disse o músico, sem revelar o valor da valiosa e rara peça que levou seis meses para ficar pronta, o que é considerado pouco tempo.
O grupo conta com um consorte renascentista utilizado para a execução de músicas desse período, embora, atualmente, não toquem um repertório que abarque esse tipo de música. O conjunto de instrumentos foi elaborado por Adrian Brown, exímio luthier britânico que mora na Holanda, e demorou cinco anos para ficar pronto, entre 2008 e 2013. “São nove flautas, mas na ocasião demorou bastante, porque a fila de espera era de cinco anos”, disse o músico.
“CABOCLO”
O repertório do novo CD do Quinta Essentia, “Caboclo”, será gravado na Alemanha pelo selo ARS e será apresentado no concerto que acontece na embaixada brasileira em Berlim, no dia 29 de março; e na China, dia 12 de abril, durante o Shenzhen Belt & Road Music Festival. “Na China, participaremos de um dos maiores festivais que acontecem por lá. É um festival monstruoso, enorme, e que dura o mês inteiro, com concertos de música erudita, tradicional chinesa, jazz e popular. Pediram que fizéssemos um repertório um pouquinho mais longo. Por isso, incluímos dois contrapontos de ‘A Arte da Fuga’”, contou Gustavo.
O disco com o repertório de “Caboclo” não tem data para ser lançado. “Nossa experiência com relação à gravação de discos é muito diversa, pois cada disco foi muito diferente do outro em relação a tempo de produção. Esperamos que saia rápido”, disse o músico do quarteto. Além dos discos do Quinta Essentia, o grupo fez participações especiais em dois CDs:“Um deles, gravado ao vivo, no festival de música antiga em Missiones de Chiquitos, na Bolívia, em 2014, no qual figuramos em duas faixas, que contêm quatro movimentos. Nossa outra participação especial está registrada, também ao vivo, no disco “Diálogos Improváveis” da CPFL Cultura, em 2015.”
Por que irão gravar na Alemanha? “O grande mercado consumidor está no hemisfério norte e não há como negar isso. Gravamos o ‘A Arte da Fuga’ aqui no Brasil, no estúdio excelente da FATEC Tatuí, com o professor do curso de produção musical, o flautista José Carlos Pires Júnior. Estávamos no processo de edição e recebemos o convite da gravadora alemã para publicarmos o disco na Alemanha, que nos ofereceu o selo para registrarmos o trabalho de maneira muito favorável”, disse Gustavo sobre o selo que abocanhou recentemente, segundo ele, o certificado de melhor selo de gravação de música erudita da Europa.
INSTRUMENTOS PARA TODOS OS SONS
A família das flautas doces é ampla, da mais aguda à mais grave temos: sopranino, soprano, contralto, tenor, baixo, grande baixo, contrabaixo, subgrande baixo e subcontrabaixo. “Sub é uma oitava abaixo da respectiva, ou seja, com uma subgrande baixo, toca-se uma oitava abaixo da grande baixo e com uma subcontrabaixo toca-se uma oitava abaixo da contrabaixo. A subgrande baixo quadrada que usamos tem cerca de dois metros e trinta centímetros de
comprimento”, explicou o professor desse instrumento que em geral possui a extensão de duas oitavas “mais um pouquinho”. “As flautas modernas que usamos no repertório do disco que iremos gravar na Alemanha, o ‘Caboclo’, tocam três oitavas, o que vai muito além das flautas barrocas a que estamos acostumados”, explicou Gustavo.
O que produz a afinação em instrumentos de sopro é o tamanho do instrumento. “É o comprimento do tubo. No caso das flautas quadradas, colocamos um quadradinho ou mais de madeira que expande o tamanho do instrumento. Em flautas cilíndricas, é só abrir ou fechar mais o bocal na cortiça que o une ao corpo.”
Flautas doces podem custar de R$10 a 6 mil euros. No site do Quinta Essentia são comercializadas flautas de R$ 270 a um pouco mais de R$ 5 mil. Gustavo é representante, no Brasil, das flautas da fábrica alemã Mollenhauer, disponíveis sob encomenda aceitas por e-mail, telefone ou mensagem privada na página do grupo no Facebook. “Faço isso porque no começo, quando abrimos o Centro Suziki, tínhamos alunos que tocavam muito bem e no Brasil não se encontra, até hoje, flautas de excelente procedência feitas de madeira. Há algumas séries de flautas de resina da Yamanha que, para quem quer começar a estudar, são aceitáveis, mas não são excelentes. Para quem quer realmente se dedicar a esse instrumento, elas não são suficientes.”
Por que a flauta doce é especialmente útil para o início do aprendizado musical? “Acho que tem algo a ver com as histórias de criança que usam a flauta. Há muitas histórias na literatura com flautas, além disso temos a questão do tamanho do instrumento. A flauta doce soprano, que geralmente é usada nas escolas, tem um tamanho muito menor que outros instrumentos. A flauta transversal, o violino e o oboé, por exemplo, têm o dobro de tamanho da flauta doce soprano. Se você comparar o tamanho dos instrumentos, realmente a flauta doce é mais adequada para crianças.”
Quanto a instrumentos baratos, o professor Gustavo alerta: “Esses não são instrumentos de verdade e sim brinquedos. Costumamos fazer a seguinte comparação: quando você vê um piano de brinquedo não confunde com um de verdade, porque o de brinquedo é sempre bem menor do que o de verdade. Um violino ou violão de brinquedo idem, é sempre menor que um de verdade. No entanto, as pessoas, por alguma razão que não sei qual é, acham que a flauta de plástico é uma flauta de verdade, e não é. A flauta doce de verdade é sempre de madeira, e o som é muito diferente de um instrumento de qualidade comparado a um instrumento que você encontra em qualquer loja de música.”
FLAUTAS E REPERTÓRIOS
Há vários compositores compondo para flauta doce atualmente. No repertório de “Caboclo”, há duas músicas novas escritas recentemente por compositores brasileiros que escreveram as peças exclusivamente para o Quinta Essentia. “ Um deles é o Daniel Wolff, violonista e professor da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul). O outro excelente compositor é o Tim Rescala, que fez a trilha de abertura da novela ‘Meu Pedacinho de Chão’ [2014]”, disse Gustavo sobre o compositor, pianista e humorista que participou da Escolinha do Professor Raimundo, entre outros programas, e escreveu a peça “A Banda de Pífaros do Rei Arthur” para ser gravada exclusivamente pelo grupo.
Segundo Gustavo, nessa peça o compositor mistura um pouco da música medieval com um pouco da música nordestina. “Tem a cara dele, é uma trilha. Como a música é feita em quatro vozes tem essa cara de medieval e um resultado muito interessante”, falou o músico antecipando que a composição de Wolff, chama-se “Flautata Doce”. “Na música temos sonata, tocata, cantata e como ele [Daniel Wolff] escreveu a música originalmente para flauta doce batizou-a de ‘Flautata’”, disse Gustavo acrescentando que essas serão as únicas peças escritas originalmente para flautas doces. As demais músicas do CD têm arranjos escritos por Gustavo.
Entre as peças do repertório de “Caboclo” há músicas de Radamés Gnattali (1906-1988), como o “Quarteto Nº 3”, originalmente escrita pelo maestro gaúcho para quarteto de cordas, transcrita para flautas, além de “Lenda”, “Seresta Nº 1”, “Seresta Nº 2” e “Cantilena”.
No repertório de “Caboclo” há quatro flautas quadradas e cinco modernas. “Depois da primeira turnê do grupo, em 2009, aprendemos muito. Tínhamos acabado de gravar o ‘La Marca’ e queríamos mostrar tudo o que conseguíamos fazer, além disso escolhíamos o repertório para usarmos todas as flautas que tínhamos. Fomos para a Itália, França e Alemanha usando 35 flautas, inclusive as grandes. Foi um transtorno, porque, além de nossas malas, havia muitas caixas para serem carregadas, despachadas e encontradas”, contou o músico que aprendeu, a partir dessa experiência, a não viajar com muitos instrumentos que, somados, podem chegar a mais de 60 flautas.
Ainda no repertório de “Caboclo” os músicos usam apenas um tipo de flauta, um consorte moderno. Em “A Arte da Fuga”, um consorte barroco, são usadas nove flautas totalmente diferentes, com outra afinação. Curiosamente, o consorte renascentista também tem nove instrumentos, além de flautas específicas que podem ser adicionas em cada um desses repertórios.
“Dependendo do que vamos tocar, adicionamos ou subtraímos as flautas. Outra coisa que fomos aprendendo com o tempo é quem toca o quê. Obviamente todos os músicos do quarteto tocam todas as flautas, mas na hora de escolher quem irá tocar o que, levamos em consideração o mínimo de vezes que iremos trocar de flauta dentro do repertório. Geralmente, quem troca mais de flautas é quem executa as vozes das pontas. Por exemplo, quem toca a flauta mais aguda, na próxima música vai para a mais grave. Quem toca as flautas do meio, por exemplo a tenor ou baixo, acaba ficando mais tempo com a mesma flauta, do começo ao fim, ou quase do começo ao fim”, explicou o professor que no repertório de “Caboclo” ataca de flauta soprano, contralto e contrabaixo. Renata Pereira toca soprano, contralto, grande baixo e subgrande baixo. Já Francielle Paixão segura a onda, quase o tempo todo, tocando flauta tenor, alternando-a, às vezes, com a grande baixo, enquanto Pedro toca as flautas contralto e baixo.
CONCURSOS
O Quinta Essentia ganhou vários concursos de música. Entre eles, o Beverly Hills National Auditions, nos Estado Unidos (2018), Prêmio Estímulo de Música da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo (2007), Concurso Nacional Jovens Cameristas Petrobrás (2007), Quartas Musicais BNDES (2017), Edital Arte Educação do SESI SP, com “Flauta, Flautinha, Flautão!” (2014) e ProAC da Secretria de Educação e Cultura de São Paulo, de gravação de disco e espetáculos, com “Falando Brasileiro” (2012/2013).
Indagado sobre qual a real importância de concursos de música e a legitimidade deles, o artista respondeu com uma história: “ Perguntei para uma amiga, que acabou de ganhar um concurso na Bélgica, por que as pessoas fazem concursos? Música não é esporte, e é complicado você julgar quem é o melhor e o pior, porque às vezes é só diferente. E ela respondeu: ‘Riqueza e glória’. É mais ou menos isso. Não acho que participar de um concurso seja algo que um artista precisa almejar, porém um concurso ganho abre portas e não podemos fechar os olhos para isso.”
No caso da música popular há, por exemplo, há o The Voice que, na opinião de Gustavo, é uma grande plataforma, onde o artista se torna conhecido. “O fato de você se tornar conhecido abre portas.Além disso, quando você ganha um prêmio, o júri te dá um carimbo falando: ‘Ok, esse grupo é bom’. Isso faz com que pessoas, que não aceitavam o seu trabalho, ou não queriam saber dele, passem a aceitar. Mas participar de um concurso e não ganhar também não é menos meritório.”
Para Gustavo, um concurso é bom ao funcionar como uma plataforma para que o artista apareça, mas nem sempre é rentável. “Quase nunca o concurso dá um prêmio em dinheiro que justifique você participar e se sujeitar à exposição ruim, que pode acontecer, se você perder.” No entanto, o artista concorda que essa é uma maneira de se atingir novos públicos. “Isso é algo que estamos fazendo desde o início. Não queremos tocar somente para aqueles que já conhecem flauta doce ou música antiga, que é nosso repertório mais tocado. Por isso, procuramos todas as oportunidades possíveis para atingirmos um público novo. Entre elas, participarmos de concursos”
A busca pela ampliação do público por meio de concursos vem junto com outras ações do grupo. Entre elas, usar instrumentos diferentes e tocar sem partituras. “Achamos isso essencial. É uma coisa que geralmente músicos eruditos não costumam fazer, mas para nós é muito importante. O fato de tocar de cor atrai mais público, e realmente a gente acredita nisso. Quando vemos um músico ou artista, de qualquer estilo, da música popular, nenhum deles está com partitura na frente. Sabemos que no mundo atual, onde o vídeo, a imagem, é tão importante, não podemos abrir mão e tocarmos com uma estante de partituras na nossa frente. Precisamos olhar para o público e que ele nos veja tocando para comunicarmos melhor com nossa música. Acho que isso é o que fazemos de melhor.”
VIAGENS
Segundo Gustavo, cada viagem tem “um gostinho diferente”. A primeira viagem do Quinta Essentia foi para a Europa e proporcionou aos integrantes contatos com “coisas” que fomentavam o que estudavam na ocasião. “Por exemplo, estudávamos muito a música francesa e fomos ao castelo de Versalhes. Depois, tocamos no castelo onde o compositor Haendel trabalhou. Fomos para a Itália, tocar no castelo Ruspoli, atendendo o convite de Giada Ruspoli [uma das proprietárias do castelo]. Em 2010, retornamos para esse castelo e depois fomos para a China. Como eu iria imaginar que a flauta doce iria me levar para o outro lado do mundo para tocar?”
Em 2012, o grupo foi para a Namíbia, a convite da embaixada do Brasil em Windhoek [capital e cidade mais populosa da Namíbia]. Tocamos música brasileira, com o repertório do ‘Falando Brasileiro’, para 600 pessoas no Teatro Nacional da Namíbia. Nunca iria para a Namíbia se não fosse flautista, uma viagem que recomendo a todos, pois, além de não ser uma viagem muito cara, é o melhor lugar do mundo para se apreciar a vida selvagem. Fomos para os Estado Unidos, em 2016, onde fizemos dez concertos em cinco estados diferentes. Também estivemos na Bolívia, no Festival de Chiquitos, e realizamos cinco concertos pelo país em cinco cidades diferentes. Tocamos na Europa outras vezes, em festivais na França e em Portugal. Em 2017, estivemos na Austrália tocando e dando aulas em Melbourne, Sydney e Woodend. E agora vamos voltar para a Europa e China novamente”, disse o músico que, por meio de suas flautas doces, dedicação e respeito à música já visitou todos os continentes, menos a Antártica.
O que as pessoas devem ter em mente quando forem escutar o som do Quinta Essentia? “Primeiro, somos um grupo brasileiro que busca a excelência em tudo o que faz. Não queremos fazer o que outras pessoas já fazem. Queremos fazer melhor do que todos já fizeram.”
De acordo com o músico, tocar afinado, com as notas certas e de cor é o mínimo que podem fazer. “Isso é feijão com arroz, outros grupos já fazem. Partimos desse mínimo, para fazermos coisas que ninguém fez. Por exemplo, o repertório que estamos tocando [“Caboclo”] ninguém fez, porque tem obras com instrumentações diversas. Tem coisas para quartetos de cordas, metais, como ‘Choro Nº 4’, do Villa-Lobos; coisas originais para piano, como ‘A Lenda do Caboclo’ que ele [Villa-Lobos] também escreveu para orquestra e, se ele fez com outras instrumentações, também podemos tocar com flauta doce, além de ter também músicas escritas originalmente para esse instrumento. Enfim, escolhemos músicas de compositores brasileiros consagrados, que escreveram peças muito bonitas e que pudéssemos adaptar com ganho. Não basta ser uma transcrição, tem de ser uma transcrição, com algo a falar sobre essa música. Não basta apenas reproduzir, temos de acrescentar.”
Retornando da China, o grupo tem um concerto agendado para o dia 11 de maio, no teatro Polytheama, em Jundiaí, São Paulo. “Nesse concerto também apresentaremos o repertório de ‘Caboclo’”, disse o artista.
Conheça, a seguir, um pouco de cada integrante do Quinta Essentia e o que pensam sobre o grupo. Depois, assista no final do texto aos vídeos nos quais o grupo toca, com exclusividade, para o blog.
QUEM É QUEM NO QUINTA ESSENTIA
Nome completo: Gustavo Henrique de Francisco
Nome artístico:Gustavo de Francisco
Idade: 40
Local de nascimento: São Caetano do Sul (SP)
Instrumentos que toca: “Toco flauta doce, que inclui uma família imensa de instrumentos. Temos os instrumentos classificados por tamanho, como as flautas doces soprano, contralto, tenor e baixo (mais conhecidas), mas também outras ainda menores e mais agudas que a soprano, e outras ainda maiores e mais graves que a
baixo. Existem também outras classificação por tipo ou período, como as flautas renascentistas (com corpo cilíndrico e largo), as flautas barrocas (com corpo cônico e estreito), e as flautas modernas (com corpo quase cilíndrico e mais alongado ao final do tubo). Cada uma delas possui características únicas. Cada uma dessas famílias possui instrumentos de todos tamanhos, que, combinados, temos uma possibilidade de mais de 100 diferentes instrumentos. Além de toda a dedicação à flauta doce, também dediquei parte da minha vida para tocar oboé moderno e barroco.”
Formação acadêmica: “Sou engenheiro eletrônico formado na Escola de Engenharia Mauá, em 2001, e também formado em flauta doce e oboé pela Fundação das Artes de São Caetano do Sul.”
Como define o grupo? “Somos um dos grupos de música de câmara brasileiros mais atuantes na atualidade, sempre mostrando a flauta doce brasileira no seu mais alto nível. Fazemos uma média de 25 concertos por ano e, pelo menos, uma turnê internacional por ano. Somos empreendedores e independentes, pois desde o início, em 2006, nunca fomos ligados a uma instituição que nos patrocinasse.”
Além da formação, em termos de sonoridade no que o grupo se destaca? “Nos destacamos de outros grupos com formação similar pela forma como encaramos a música. Tocamos de cor, pois assim nos conectamos melhor com o público; tocamos música antiga com cópias de instrumentos da época que a música foi concebida e historicamente informados de sua prática, mas com extremo cuidado para que essa música do passado tenha um grande impacto no público de hoje, sem parecer música de museu.”
Qual a maior dificuldade que o grupo encontra? “Para sermos reconhecidos pelas grandes séries e curadorias de concertos, temos que tocar pelo menos cinco vezes melhor do que outros músicos que tocam os instrumentos da chamada ‘santíssima trindade’ (voz, cordas e piano). Apesar disso, tivemos muitas conquistas, com resenhas internacionais excelentes em nossos mais recentes trabalhos.”
O que as pessoas devem ter em mente quando forem ouvir o grupo? “A música sempre transmite uma mensagem, mesmo a instrumental. O público não deve se ater a estilos, pois tocamos todos os estilos, mas, sim, buscar absorver a mensagem contida na música que fala por ela mesma.”
Fazer música como integrante desse grupo é…? “Fantástico, pois é nesse grupo que eu expresso o que tenho de melhor para o público, e que durante todos esses anos me possibilitou conhecer pessoas maravilhosas por onde o grupo passou. Também me fez conhecer melhor o ser humano, seus prodígios e também suas falhas, e conhecer culturas de diversos países, o que me ensinou a questionar meus próprios valores.”
Nome completo: Renata Pereira
Nome artístico: Renata Pereira
Idade: 36
Local de nascimento: Joinville (SC)
Instrumentos que toca: “Flauta doce, que possui uma família de instrumentos de diferentes tamanhos, períodos históricos em que foram construídas, sonoridades diferentes. E, por essa razão, um flautista profissional necessita tocar todos os instrumentos da família da flauta doce.”
Formação acadêmica: “Bacharel em flauta doce na escola de Música de Belas Artes do Paraná, Curitiba, em 2004; mestrado em Música (ECA-USP), em 2009; doutorado em Música (USP- ECA), em 2014.”
Como define o grupo? “O Quinta Essentia é um dos poucos grupos de música de câmara no mundo a divulgar a flauta doce na formação quarteto e apresentar as infinitas possibilidades de fazer música com esses instrumentos.”
Além da formação, em termos de sonoridade no que o grupo se destaca? “A nossa formação é inusitada. Temos poucos quartetos de flauta doce no mundo. Posso mencionar quatro ou cinco. E somos um quarteto de flautas doces brasileiro. Nos destacamos no mundo, da mesma maneira que nos destacamos no Brasil, ou seja, formação musical instrumental inusitada e, fora do Brasil, com o adicional de fazermos música brasileira além do repertório camerístico para o instrumento. Para quem não conhece flauta doce, sua história e as possibilidades desse instrumento, nos destacamos das demais formações musicais porque a flauta doce apresenta uma sonoridade clara, transparente, por meio das infinitas possibilidades de articulação na produção do som, e por sua característica
‘honesta’: sempre dizemos que é impossível mentir ou fingir, artisticamente, quando tocamos uma flauta doce. Tudo é evidente, tudo aparece. É um instrumento muito simples, que exige uma alta execução e cuidado de seus instrumentistas. Por mais que outros músicos possam não concordar, quando tenho colegas que estudaram flauta doce e outros instrumentos, sempre escuto deles que a flauta doce é o instrumento mais difícil de se tocar bem. Por essa razão, o ouvinte atento, que deseja experimentar uma sonoridade rica na sua simplicidade, uma formação que trate a matéria-prima da música (o som) de maneira ao mesmo tempo brilhante, pura e honesta, na mais alta habilidade de um quarteto de flauta doces, definitivamente deve estar aberto para conhecer o trabalho do Quinta. É isso que buscamos: Simplicidade, Verdade e Beleza.”
Qual a maior dificuldade que o grupo encontra? “É a de manter o processo necessário para conseguirmos o resultado do trabalho. O Quinta Essentia é um grupo de música de câmara, que mantém um trabalho regular de ensaios semanais e concertos durante cada temporada. Um grupo com um trabalho regular, normalmente só é viável sendo um corpo estável de alguma instituição, como uma orquestra, por exemplo. Desenvolver esse trabalho regular é algo fundamental, contudo um desafio quando independente. Somos os próprios financiadores/investidores do trabalho constante necessário para que a magia do palco aconteça para o público.”
O que as pessoas devem ter em mente quando forem ouvir o grupo? “Ouvir flautas doces é experimentar a beleza mais sublime nas coisas mais simples. Assim, como uma criança que brinca o dia inteiro com o mesmo brinquedo e dá asas à sua imaginação, o público do Quinta Essentia passa todo o concerto sendo conduzido a imaginar histórias, conhecer músicas, compositores, instrumentos diferentes, além de poder simplesmente se deixar levar pela pureza do som. Afinal de contas, não é algo inédito o som da flauta doce ser associado às histórias dos pastores, ao sobrenatural e à simplicidade daquilo que é divino, como os ouvintes da Renascença e do Barroco costumavam fazer.”
Fazer música como integrante desse grupo é…? “Uma experiência única. É ter a liberdade de fazer o trabalho artístico que acredito. É levar a expressão musical artística brasileira para todos os cantos do mundo. É poder compartilhar com mais pessoas o que acreditamos ser a prática da flauta doce. É manter um instrumento musical e toda sua história vivos. É dar o exemplo para que mais apaixonados da flauta doce no Brasil não tenham que abrir mão da sua escolha, seja artística, seja profissional. É seguir com a beleza da simplicidade. É poder encantar pessoas através dessa linguagem sem palavras. Aquela que preenche o coração e amplia sensações. E todos os dias poder dizer: eu amo levar a vida na flauta!; mesmo que na língua portuguesa, ainda que de modo infeliz, esta seja uma
expressão de significado injusto quando na prática o que vivo é uma paixão por um instrumento musical cujo ofício reivindica muito trabalho todos os dias.”
Nome completo: Pedro de Magalhães Ribeiro Bruno
Nome artístico: Pedro Ribeirão
Idade: 25
Local de nascimento: São Paulo (SP)
Instrumentos que toca: “Flauta doce quadrada basseto, flauta doce quadrada grande baixo, instrumentos exigem muito fôlego e controle de ar, por serem muito grandes. Também toco flauta doce moderna contralto, Tarasov, parecida com uma flauta doce barroca, mas possui chaves que aumentam sua extensão (mi 4 – dó# 7).”
Formação acadêmica: “Escola Municipal de Música de São Paulo em flauta doce (2010) e flauta transversal (2015).”
Como define o grupo? “A principal referência de um conjunto de flautas doce do Brasil.”
Além da formação, em termos de sonoridade no que o grupo se destaca? “Nós nos destacamos por tocar uma grande variedade de flautas, principalmente as modernas. A flauta doce explorando os limites da formação de quarteto, com uma performance ao vivo refinada e envolvente.”
Qual a maior dificuldade que o grupo encontra? “Difundir a flauta doce para além dos seus horizontes convencionais, cativando ouvintes do mundo todo com um repertório arrojado e inovador.”
O que as pessoas devem ter em mente quando forem ouvir o grupo? “Se abrir para uma nova sonoridade de quarteto moderno e brasileiro.”
Fazer música como integrante desse grupo é…? “Um prazer, um desafio e um aprendizado.”
Nome completo: Francielle da Silva Paixão
Nome artístico: Francielle Paixão
Idade: 30
Local de nascimento: Pouso Alegre (MG)
Formação acadêmica: “Bacharelado em regência, 2011.”
Como define o grupo? O Quinta é um grande representante da flauta doce no mundo. Destaca-se por usar uma grande variedade de instrumentos e repertório bastante amplo. Não diria que temos uma dificuldade, mas sim um desafio: levar a flauta doce para o universo das grandes salas de concerto do Brasil e do
mundo.
O que as pessoas devem ter em mente quando forem ouvir o grupo? “As pessoas devem estar atentas quando à variedade das articulações e timbres que são possíveis nas diferentes flautas utilizadas durante o concerto.
Fazer música como integrante desse grupo é…? Fazer música com o Quinta tem sido um grande aprendizado, tenho vivido experiências maravilhosas. É uma enorme satisfação.”
Assista, a seguir, aos vídeos no qual o grupo interpreta, com exclusividade para o Música em Letras, duas peças musicais do repertório de “Caboclo”.