Amaro Freitas, um dos mais talentosos pianistas da atualidade, faz show em São Paulo
Acontece hoje (11), no Sesc Pompéia, em São Paulo, o show que marca o início da turnê do álbum “Rasif”, do pianista pernambucano Amaro Freitas, 28, que tem se apresentado na Europa com muito sucesso. O Música em Letras conversou com Freitas sobre o disco e show. Leia, a seguir.
Entre os países que Freitas mostrou sua música, sendo reconhecido por seu grande talento, estão Alemanha, Portugal, Inglaterra, Espanha, França e Suíça. No Brasil não é diferente, pois o músico tem amealhado, além de prêmios como o MIMO Instrumental e o Savassi Jazz, uma série de críticas favoráveis ao seu trabalho e inúmeros fãs da música de qualidade, incluindo o autor desse blog.
“Rasif” é o segundo CD do pianista e não difere do primeiro, “Sangue Negro” (2016), em termos de bom gosto, criatividade e contribuição musical. Embora diferentes na sonoridade, percebe-se nos dois trabalhos o virtuosismo e a dedicação plena de Freitas à música, que bebe nas fontes do maracatu, baião e frevo, chegando com muito domínio rítmico e harmônico ao jazz. O resultado é um som único, com muita personalidade musical demonstrada nas nove faixas autorais do disco. Entre elas, além da “Rasif”, “Vitrais”, “Paço”, “Trupé”, “Dona Eni”, “Plenilúnio”, “Afrocatu”, “Aurora” e “Mantra”.
Para chegar ao resultado excelente desse trabalho, Freitas ressalta a valorização do tempo, para que a música amadureça e ganhe consistência. “Chegamos em ‘Racif’ após tocarmos, mais de um ano, todas as músicas do disco. Com isso, as músicas mudaram muito.”
O processo de amadurecimento das músicas é facilmente reconhecido ao se escutar o disco, que, além de maturidade, apresenta uma “verdade” incontestável em todas as nove faixas. “As músicas estão diretamente relacionadas ao que foi vivido nesse tempo. Portanto, elas não são forçação de barra de um estereótipo solicitado. Não é pelo fato de ser brasileiro que tenho de tocar sambajazz e bossa nova”, explicou o músico, autor do disco totalmente voltado para experiências que viveu desde o lançamento do CD “Sangue Negro” (2016), incluindo sua bem sucedida turnê europeia.
Uma delas foi presenciar a música “Trupé” sendo dançada pelo público, com sandálias de madeira, em um tablado montado em Arco Verde, na “porta do sertão” de Pernambuco, repetindo a célula musical que os músicos executam na peça. “Trouxe isso para o piano de uma forma rítmica, pensando o instrumento de uma maneira mais percussiva. Apesar de ele ser um instrumento de percussão, nem sempre é explorado dessa forma.”
Em “Rasif”, uma ciranda, fica explícita a influência árabe muito forte que há em Pernambuco. “Rasif é uma palavra árabe que dá origem a palavra Recife, que antes passa por ‘arasif’ e ‘aresife’. Em um trecho dessa música tento simbolizar o mar quebrando nas pedras, porque Pernambuco significa, em tupi, “mar que arrebenta”, falou o compositor que consegue o efeito proposto, com muita propriedade.
Já a música “Dona Eni”, um baião, tem uma história curiosa. “Toda vez que vamos fazer shows no Ceará, ficamos na casa de dona Eni, que faz baião de dois [ prato típico da região Nordeste e Norte, cujo preparo inclui arroz, feijão verde ou feijão novo] no café da manhã, no almoço e no jantar. Até na hora do chá tem um pratinho de baião de dois”, contou rindo o exímio instrumentista.
Todas as músicas estão relacionadas à verdade temporal de Freitas. Ele acredita que seu próximo disco terá uma sonoridade totalmente diferente, pois certamente irá vivenciar outras experiências, com outras pessoas, em outros lugares. “Isso é o que há de mais precioso e genuíno em meu trabalho, que é a verdade em tempo real”.
Freitas valoriza também o “tocar com intenção”, que, segundo ele, serve para qualquer tipo de ação na vida. “Quando você bate uma bola que você quer bater colocada, ou de trivela, você tem uma intenção naquele chute. Um nadador que escolhe um dos diversos estilos que existem na natação, também tem uma intenção naquele nado. É a mesma coisa que tocar.”
A intenção de Freitas e o que ela acaba causando nas pessoas é uma das muitas buscas do instrumentista, que às vezes toca o piano sem pressionar a teclas totalmente, gerando um som mais percussivo do que melódico, enfatizando essa característica do instrumento. Na música “Mantra”, por exemplo, o artista utiliza muito esse recurso. “A intenção é exatamente essa. Os caras [músicos que o acompanham] seguram tocando a mesma frase o tempo todo até gerar esse mantra. Aí descolo deles, entrando em um sonho paralelo, tocando uma outra música, sozinho, e usando a região mais grave do piano que causa tensões no corpo.Tocar com intenção faz toda a diferença na construção musical.”
Sobre o que as pessoas devem ter em mente quando forem ao show de hoje, Freitas alerta:“Se as pessoas puderem estar abertas para se conectarem com a gente será muito bom. A coisa mais importante do show é essa troca do público com o artista. Por isso é bom que o público vá sem expectativas, porque elas são melhores preenchidas quando você não as tem.”
Essa é uma excelente oportunidade de ouvir a diversidade de ritmos musicais sendo valorizada com talento, criatividade, de fácil conexão com o público. É impossível passar incólume a essa música contagiante, bem elaborada, trabalhada, extremamente vivida e, por isso, muito viva.
O disco em vinil será vendido a R$ 100 e o CD R$ 30. Ambos importados.
SHOW LANÇAMENTO DO DISCO “RASIF”
ARTISTA Amaro Freitas
QUANDO Hoje (11), às 21h
ONDE Sesc Pompéia, r. Clélia, 93, Água Branca, São Paulo, tel. (11) 3871-7700
QUANTO De R$ 6 a R$ 20
DISCO “RASIF”
ARTISTA Amaro Freitas
QUANTO Vinil, R$ 100; CD R$ 30
GRAVADORA Far Out Recordings
DISTRIBUIDORA Tratore
QUANTO Vinil, R$ 100; CD R$ 30