Taciana Barros, Karina Buhr e Ana Cañas cantam Belchior
Dizer que o cantor e compositor Belchior(1946-2017) é homenageado em show é dizer nada. Não só pela quantidade de gente fazendo isso para “bater uma carteira” nas costas do artista e sua obra, como pela reverência que todos têm por ele e seu legado.
No entanto, dizer que Taciana Barros, Karina Buhr e Ana Cañas apresentam show em homenagem a Belchior, amanhã (17), no Bourbon Street, em São Paulo, é dizer bastante pelo talento eloquente das três artistas, cantoras e compositoras.
O Música em Letras esteve no ensaio em que estavam Taciana Barros e Karina Buhr para entrevistá-las e saber mais sobre o show (veja vídeo no final do texto).
A santista Taciana Barros, 53, começou nessa cidade do litoral paulista tocando heavy metal em um teclado antes de ter uma carreira passando pelo Gang 90 e outros projetos, entre eles, o Pequeno Cidadão, um grupo de rock- com Edgard Scandurra na guitarra- divertido e educativo para crianças.
Segundo Taciana, os arranjos para as músicas de Belchior que estarão no show envolveram, além dela (voz, violão e guitarra), os músicos Thiago Barromeo (violão de aço, nylon e guitarra) e Igor Brasil (guitarra e violões). O trio se reuniu “bastante” antes de escrevê-los. “Os arranjos são nossos. Os músicos me ajudam bastante na questão de timbre. Por exemplo, o Igor escreveu as partituras e já deu um adianto. Cada um contribui de um jeito”, disse a roqueira Taciana que, antes de se unir aos instrumentistas, teve em mãos as músicas de Belchior escolhidas pelas intérpretes para cantar no show.
Roqueira mais experiente, Taciana deixou as outras duas colegas de profissão selecionarem antes dela as músicas que interpretariam. “Como estava organizando, achei que não podia pedir nenhuma música antes delas, mas ficava rezando para ninguém escolher ‘Paralelas’. Ninguém pediu e peguei para mim”, contou rindo a cantora que interpreta a música de uma maneira que “ficou menos canção e mais uma música pop, com uma pegada acústica”.
Com a base pronta e elaborada pelos três músicos, houve uma segunda fase com readaptações dos arranjos, inserindo elementos novos trazidos pelas três cantoras. “Nesse outro momento, acertamos os tons e vimos que, por exemplo, ‘Pô, esse pedaço está rendendo, mas está mais rock and roll. Vamos mudar? Faz guitarra nessa’. Aí elaboramos novamente os arranjos”, disse Taciana, que no show, além de “Paralelas”, canta “Divina Comédia Humana”, entre outras.
A música “A Palo Seco” é bom exemplo de como a coisa se dá. No início, a canção contava com três violões. Quando Karina Buhr começou a cantá-la, com uma veia rock and roll, Thiago trocou o violão dele por uma guitarra, e a música tomou outro rumo. (Veja vídeo no final do texto).
No show, atriz Martha Nowill contextualiza algumas músicas, lê trechos de outras que não estão no repertório, mas figuram como poesia e conta histórias de como Belchior conheceu Elis, por exemplo. O show tem por base o livro “Belchior: Apenas um Rapaz Latino-Americano” (editora Todavia), escrito pelo jornalista Jotabê Medeiros.
LIVRO LEVA À SHOW
“Tudo começou por causa do livro. A Ciça Pinheiro, que trabalha na Todavia, me ligou e falou “Taci, a gente quer lançar o livro. Inventa alguma coisa pra fazer. Então eles são um pouco culpados por esse show. Foi o gatilho”, disse Taciana, acrescentando que o livro foi importante, pois por meio dele a cantora passou a entender mais sobre o “universo bem complexo e bem rico de um cara libertário que veio para renovar”.
O show já foi apresentado algumas vezes com sucesso. “É um show bem emocionante, porque de alguma forma ele fala com o coração e com as questões existenciais da gente e de quem está assistindo. As pessoas choram no show direto, e a gente também. Tem alguma mágica nessa poética dele que pega no fundo da gente.”
Taciana disse ainda que aprendeu muito por ter entrado no universo de Belchior e ter decupado as harmonias de suas canções e suas letras, o que lhe possibilitou entender melhor os caminhos existentes para cantar. Nesse processo, a emoção tomou conta. “Estamos vivendo momentos muito difíceis e o Belchior é atual, pois é muito bom poder chorar, se emocionar e não endurecer o coração. Isso me faz bem e acho que é isso que acontece com o público que vai a esse show.”
ATENÇÃO ÀS LETRAS
Karina Buhr, 43, nasceu na Bahia, com oito anos mudou-se para Recife, mas sempre que pode voa para Salvador. A música que escolheu? “Medo de Avião”. Perguntada de como a música está sendo tratada por sua interpretação, respondeu: “Ela está bem louca, como ela é na verdade. Eu ouvia essa música quando era pequena, mas não lembrava que a letra era assim. E é muito bom cantar ela nessa formação, sem bateria, porque fica muito essa coisa da letra na frente; é muito engraçado porque essa letra é surreal.”
A cantora está curtindo conviver com os integrantes do show, também pela oportunidade de fazer um som com essas pessoas. “Em São Paulo, se deixar, ninguém se vê. Só nos vemos em projetos, aí é que a gente se encontra.” Karina disse, ainda, estar gostando de “ressignificar as letras das canções de Belchior, porque ele tinha um jeito de cantar que, para mim, por exemplo, com relação às divisões, parecia que estava fazendo a música ali, na hora. Nesse sentido, acabamos botando muito da gente na forma de dividir o ritmo e as letras”, disse a cantora que acabou por descobrir, em algumas das 14 músicas que interpreta no show, partes das letras que não conhecia, entre elas a de “Retrato 3X4”.
Para o músico Thiago Barromeo o mais difícil ao se apresentar com esses três talentos é tocar sem bateria e sem contrabaixo. Sim, mesmo que você tenha lido nesse texto menção ao estilo rock and roll, e automaticamente tenha pensado em baixo elétrico nervoso, com bateras gigantescas em tamanho e som, não é bem assim que acontece. “Tocar com elas não tem problema nenhum. O mais difícil é tocar sem banda, porque com esse lance acústico temos que fazer soar uma massa [sonora], fazer o ‘chão’ da coisa”, disse o músico que pensa estar surtindo efeito com o som. “Ah, tem gente chorando no show. Acho que está rolando.”
Igor Brasil acrescentou que “a partir dos anos 1990, Belchior tocou muito em duos, com violão, ou em formações pequenas. Eram shows com ele tocando suas canções com o próprio violão, com arranjos acústicos. Usamos muito a sonoridade desses shows”.
Para Taciana Barros, isso parece mais fácil, mas é mais difícil. “Você não pode errar porque o erro aparece muito mais. Se você for dar um mi e der um mi bemol, nossa o negócio vai durar dez segundos do mi bemol e não tem ‘uma pratada’ da bateria pra te ajudar. Ao mesmo tempo é muito gostoso, porque temos que estar muito lúcidos o tempo todo e a canção vem pura. A ideia de não ter bateria é para valorizar a canção e o Belchior compositor.”
O recado para o público que for ao espetáculo vem da cantora Karina Buhr, radicada em São Paulo há 15 anos. “Acho que todo mundo que vai ao show já ouviu a maioria dessas músicas. Às vezes, as pessoas acham que nem conhecem, mas quando chegam no show cantam todos juntos. Por isso, acho que elas devem vir com essa memória para quando chegarem lá tomarem um susto. Porque vai ser diferente, já que cantamos e tocamos do nosso jeito, sem ser um cover de Belchior. Pessoas, compareçam.”
Assista o vídeo gravado com exclusividade pelo Música em Letras, no qual os artistas interpretam “A Palo Seco”, de Belchior
SHOW EM HOMENAGEM A BELCHIOR
ARTISTAS Taciana Barros, Karina Buhr e Ana Cañas, acompanhadas por Igor Brasil e Thiago Barromeo
QUANDO Terça-feira (17), às 21h30
ONDE Bourbon Street, Rua Dos Chanés, 127, Moema, São Paulo tel. (11) 5095-6100
QUANTO R$ 65,00