As muitas músicas de Toninho Ferragutti em um só show

Carlos Bozzo Junior
O instrumentista, compositor e arranjador Toninho Ferragutti (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folha Press)

No show que acontece domingo (28), às 18h, no Sesc Pinheiros, em São Paulo, o acordeonista, compositor e arranjador Toninho Ferragutti, 58, mostra “a música da maneira que eu penso”, conforme disse o instrumentista nesta terça (23), em entrevista ao Música em Letras em sua casa, no bairro da Pompéia.

Ferragutti deve mostrar músicas de sete dos seus 11 CDs, para que o público conheça e sinta a sonoridade do acordeon inserida em diferentes formações e contextos. Entre eles, o instrumento soando com os arcos de um quinteto de cordas; acompanhado de um piano; com viola caipira e com violão; trabalhando improvisação em um quinteto de jazz; e com o próprio acordeon. Em cada um desses contextos, o comportamento de Ferragutti diante da sonoridade muda. O que não muda é sua grande competência para trafegar em linguagens musicais tão distintas. Missão na qual só os bons sobrevivem.

A diversidade no show é grande. O espetáculo tem início com um quinteto de cordas mostrando o “pensar” de Ferragutti abordando a música de câmara. Para isso, toca a suíte “Na Sombra da Asa Branca”, com um primoroso arranjo de Adail Fernandes, baixista e um dos fundadores do Quinteto da Paraíba. A peça foi originalmente gravada com o quinteto no disco do acordeonista “Nem Sol, Nem Lua” (2006), relançado ano passado pela Biscoito Fino, com a adição de uma faixa trazendo “Asa Branca – Fantasia e Variações sobre o tema”, composta por Ferragutti para a OSESP (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo), utilizando acordeon e orquestra de cordas. Foi por meio desse trabalho, que já tem 12 anos, que Ferragutti teve acesso à música de câmara e oportunidade de tocar com várias orquestras do país, sob a regência de maestros notáveis. Entre eles, Cyro Pereira (1929-2011), Nelson Ayres, Leandro Carvalho e Cláudio Cruz. “Nesse momento, que abre o show, mostro o acordeon imerso na música de câmara, o que não é comum, mas o resultado é muito feliz.”

Na sequência, o artista envereda a sanfona pelos caminhos de terra deixados pela sonoridade única da música caipira. Para transmitir a poesia do gênero que reinou outrora, mas com técnica de hoje, o violeiro Neymar Dias- um dos maiores representantes desse instrumento- acompanha Ferragutti. Os dois gravaram o excelente CD “Festa na Roça” (2014), no qual tocam músicas caipiras adaptadas para duo de viola e acordeon, com arranjos singelos, simples, e talvez por isso toque fundo quem o escuta. Adaptar é parte bem realizada do trabalho desses dois instrumentistas. Neymar Dias lançou recentemente “Feels Bach”, disco no qual mostra suas próprias transcrições de peças de J.S.Bach para a ‘viola brasileira’, de maneira sublime. Do disco do duo, os artistas tocam “Olímpico”, do acordeonista, e “Boiadeiro Errante”, de Teddy Vieira (1922-1966), além de outras certamente presentes no inconsciente coletivo de grande parte da população paulista formada por migrantes vindos do interior.

O som do acordeon gaúcho aparece no espetáculo de Ferragutti, por meio do virtuoso instrumentista Bebê Kramer, um “animal tocando” como se diz no sul do país ao se elogiar um instrumentista desse porte. Os dois gravaram “Como Manda o Figurino” (2012), disco apresentado em mais de 130 shows pelo Brasil todo, e rompeu fronteiras levando esse som para a Alemanha, Nova Zelândia, Espanha e Austrália. A mescla dessas duas sonoridades é “perfume” para os ouvidos.

O músico Toninho Ferragutti (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folha Press)

ENCONTROS ESPECIAIS

Chega então o momento do show em que Toninho Ferragutti coloca a sanfona no jazz. Por meio de músicas do seu CD “A Gata Café” (2017), e amparado na sonoridade de um quinteto, o versátil artista promove um belo encontro entre músicos. Entre eles, o das palhetas da sanfona de Ferragutti com a palheta do saxofone de Cássio Ferreira. Os outros músicos que integram a banda são: Vinícius Gomes (guitarra e violão), Cleber Almeida (percussão) e Zé Alexandre Carvalho (contrabaixo acústico). O disco fez com que o acordeonista abocanhasse o Prêmio de Música Brasileira 2017, como o melhor instrumentista, na modalidade solista. O quinteto toca para o público “Chapéu Palheta” e “Egberto”, composição de Ferragutti em homenagem a Egberto Gismonti. O resultado do encontro? Muito som!

Outros dois duos sensacionais devem tomar conta do palco, das almas, das mentes e dos corações. Um reúne Ferragutti e o violonista Marco Pereira, considerado uma “escola do violão brasileiro” ou “o cara que põe suingue no erudito”. Os dois artistas gravaram em duo de acordeon e violão o CD “Comum de Dois” (2014), músicas e interpretações espetaculares. Entre as que irão mostrar no show, destaque para “Sanfonema” e “Nova”.
O jovem e talentoso pianista paraibano Salomão Soares, 27, junta-se ao acordeonista em outro duo. Dessa vez, a sanfona encontra o piano na interpretação de “Beduína” e “Alfredo”, músicas que estão em um CD dos dois músicos ainda a ser lançado. “Por enquanto, está apenas nas plataformas digitais”, disse Ferragutti. No entanto, o Música em Letras teve acesso ao CD físico e constatou facilmente, na primeira “escutada”, ser esse mais um feliz encontro de dois grandes talentos. Difícil é parar de escutar!

Com um noneto – do qual participam o pianista Paulo Braga e o clarinetista Alexandre Ribeiro, entre outros-, fecha-se o enorme laço do pensar musical de Ferragutti, amarrando o show novamente com a música de câmara. Juntos, interpretam, entre outras, “O Sorriso de Manu” (2012) e “Flamenta”, com uma bonita coreografia realizada por duas dançarinas flamencas muito expressivas, Alessandra Kalaf e Priscila Grassi.

Ferragutti disse que sua intenção é a de que as pessoas saiam do show melhor do que chegaram. “Basta elas se sentarem e ouvirem para perceber minha vontade de me aproximar dessas diferentes formas de fazer música. É focando nas minhas composições, e variando nas formações, que me sinto próximo da satisfação, por me expressar melhor. Nada mais a ver ou tratar. Saudosamente, Antônio de Pádua Ferragutti”, falou rindo e se despedindo.
Assista, a seguir, ao vídeo no qual Toninho Ferragutti toca com exclusividade para o Música em Letras “Nem Sol Nem Lua”.

SHOW A MÚSICA DE TONINHO FERRAGUTTI
ARTISTAS Toninho Ferragutti e convidados
ONDE Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195, Pinheiros, São Paulo, tel. (11) 3095-9400
QUANDO Domingo(28), às 18h
QUANTO De R$ 12 a R$ 40