Thadeu Romano lança CD “Da Reza À Festa” em show
Acontece amanhã, sábado (29), no teatro da Unibes Cultural, no bairro do Sumaré, em São Paulo, o lançamento do CD “Da Reza à Festa” do acordeonista Thadeu Romano.
O Música em Letras esteve em companhia do músico no parque da Água Branca, bairro da zona oeste de São Paulo, onde o entrevistou e gravou, com exclusividade, um trecho de “Sentimento”, música de autoria de Romano e uma das 11 do repertório do CD. Veja vídeo no final do texto.
Leia, a seguir, além da entrevista, o faixa a faixa do CD com o músico comentando cada uma de suas composições.
DA ROÇA PRO MUNDO
Compositor instrumentista e arranjador, Thadeu Romano de Almeida, 35, nasceu em uma propriedade rural de Joaquim Egídio, em Campinas. Aos 15 anos, iniciou seus estudos musicais até ser laureado pelo Conservatório Adágio, em Campinas, no curso de acordeom erudito pela professora Leonor Gardon. Aperfeiçoou-se com outros mestres do instrumento. Entre eles, Toninho Ferragutti, Cesar Cantero (Uruguai) e Miguel Morgante (Argentina).
Romano continua estudando e ensinando. O músico esteve neste mês de abril aperfeiçoando-se na Argentina, com dois grandes mestres do bandoneon, outro instrumento ao qual se dedica. “Consegui ter aulas com o Ricardo Salizon, que participou de uma das primeiras orquestras típicas de tango, a do D´Arienzo [ Juan d’Arienzo (1900 – 1976) famoso músico argentino de tango], além de ter estudado, também com Rodolfo Medeiros, o mestre dos mestres de bandoneon e diretor da Academia Nacional de Tango.”
Entre as lições que aprendeu, a maior foi “andar devagar”. “Esses dois músicos têm quase 90 anos, e essa pressa de tocar bem com 35 anos foi motivo de risos para eles. Afoito, fui aconselhado por eles a ter calma para conseguir mudar a concepção harmônica, de fraseado, de destacar cada nota usando a pontuação certa, com a frase ligada, e controlar a respiração do instrumento. Por um momento achei que não soubesse nada, mas eles disseram que sei, só preciso calma para lapidar.”
Ainda na Argentina, Romano ministrou aulas de ritmos brasileiros para acordeom. “Há duas ilhas na Argentina, a ilha do Delta e a ilha do Tigre que têm muitos acordeonistas morando nelas. São mais de 40. Tem até fabrica de acordeom na Argentina. Eu pensava que só houvesse de bandoneon.
DA ROÇA PRA SAMPA
Romano veio morar em São Paulo aos 27 anos. Antes disso, já tocava em Campinas como solista em orquestras- sinfônica e de câmara-, e fazia muito baile, nos quais aprendeu a tocar vários gêneros musicais, além das peças adaptadas para acordeom de Brahms (1833 -1897), Mozart (1756 – 1791), Chopin (1810 – 1849) e Rachmaninoff (1873 – 1943). “O que me encanta é o regionalismo misturado com jazz e música erudita. Por isso, em meu disco tem de tudo um pouco, chamamé, baião, xote, choro, samba e outros gêneros”, disse o músico que se considera um apaixonado por Sivuca (1930-2006).
Quando chegou na capital, Romano passou a tocar com grupos de samba e choro. Contudo, montou o quarteto “A Fabulosa Trilha de Amélie Poulain” formado por clarinete, violino e piano para interpretar as músicas do filme “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” de 2002.
Após ter contato com um bandoneon, Romano montou o quarteto de tango Tangata, formado, além do músico tocando esse instrumento, por violino, piano e contrabaixo para executar peças compostas por Romano para essa formação. “Componho quase todos os dias.”
Atualmente, Romano toca com Renato Teixeira e Sérgio Reis no show Amizade Sincera, mas já mostrou seu som ao lado de muito artista bom. Entre alguns, Zizi Possi, Fátima Guedes, Eduardo Gudin, Dominguinhos (1941 – 2013), Naná Vasconcelos (1944 – 2016) e Peri Ribeiro (1937 – 2012).
Outro projeto realizado com sucesso por Romano é o grupo Choro in Jazz, formado por bateria, clarinete, acordeom e baixo acústico. O grupo surgiu depois que Romano conheceu o maestro e clarinetista norte-americano John Berman, amigo de Paulo Moura (1932 – 2010), que, em uma visita ao Brasil, descobriu o choro, se apaixonou e passou a estudar esse gênero musical. O Gringo, como é chamado, mudou para cá e estabeleceu uma ponte entre o jazz tradicional de New Orleans e o chorinho.
“Percebi com o Gringo que o choro cabe no suingue, e o suingue no choro. Por isso, fiz esse grupo reunindo choros dos anos 1920 a 1940, que misturo com músicas norte-americanas dessa mesma época e abro para o improviso”, falou Romano, que para essa formação escreveu “Xote pro Gringo”, um xote que vira bebop em homenagem ao maestro norte-americano.
Outro trabalho realizado com sucesso por Romano é o Ritmos do Brasil, que reúne cordas, metais, madeiras em uma banda com cerca de 20 músicos. O início de tudo veio do surgimento da Pequena Orquestra de Cinema (POC), que interpreta só temas de filmes clássicos como “O Poderoso Chefão”, “A Pantera Cor de Rosa” e “Bonequinha de Luxo”, entre outros. “Com essa formação de mais de 20 músicos, realizo um projeto educacional em que lanço novos olhares dentro da música instrumental”, disse o músico que, além de arranjar todas a peças, compôs para essa formação o frevo “Subindo a Ladeira de São José”.
CD
“Da Reza à Festa” é o primeiro disco autoral de Romano, que já gravou com Cauby Peixoto (1931 – 2016), Agnaldo Timóteo, Rodrigo Sater, além de participar dos DVDs de Chico Teixeira, Roberta Miranda, entre outros.
O disco, com 11 faixas autorais, foi feito com recursos angariados pelo prêmio do Programa de Ação Cultural (ProAC), da Secretaria da Cultura do Governo do Estado de São Paulo, ao custo de R$ 54 mil reais.
Reunindo elementos do regionalismo a elementos da música popular contemporânea, Romano funde essas dimensões, como fazia o mestre Sivuca. “Sou ‘sivuqueano’ assumido e misturo melodicamente e ritmicamente nosso regionalismo brasileiro com tudo que posso”, falou o músico que levou um ano gravando o CD.
“DA REZA À FESTA”, FAIXA A FAIXA, POR THADEU ROMANO
“BAIÃO PRO MALTA”
“Essa música fiz em homenagem ao Carlos Malta [flautista, compositor e arranjador , carioca] na ocasião em que ele participou do festival Chorando sem Parar, que homenageou o Sivuca. Fiquei encantado ao vê-lo tocando pife com a banda Pife Muderno. Acabei fazendo esse baião para ele gravar. No meio da música, vira um funkeado, no qual o Malta esmerilha, no sax soprano, juntando uma sonoridade nordestina com as loucuras que ele fazia quando tocava com o Hermeto Pascoal.”
“AO TEU LADO”
“Um frentista de posto ouviu esse baião e me disse que é um baião de breque. Ele tinha razão porque é um baião envolvente e gostoso, feito para dançar, mas a estrutura é de uma música barroca. Tive a alegria de contar com o Zé Pitoco, que é um mestre, gravando de clarinete e zabumba. Ano passado, fiz uma turnê na Europa, realizando mais de 20 shows. Passei por Paris, Amsterdã e Barcelona. Nos três lugares, essa foi a música que mais toquei, porque ela pega mesmo. No Ó do Borogodó, aqui em São Paulo, também tocam direto para o povo dançar.”
“NA ZONA DO ZÉ PILINTRA”
“Essa é uma gafieira que o François [François de Lima, trombonista da banda Mantiqueira] gravou. No meio, a gafieira vira um maxixe. Fiz essa música em homenagem ao Barão do Pandeiro, que, para mim é o Zé Pilintra [entidade da umbanda] encarnado. No final da música, ele faz o toque do pandeiro do João da Baiana [compositor carioca, introdutor do pandeiro no samba], além de tocar um prato com uma faca que foi do João da Baiana.”
“TOCA DA JARARACA”
“Fiz há sete anos essa música, que é a mais antiga do disco. Minha filha, Flora, de 7 anos, adora porque parece a perseguição de uma jararaca para pegar um bicho, uma presa. A música tem vários ritmos. Começa com um baião, depois vai para um samba e entra em uma milonga, para voltar ao samba e terminar em um baião. Quando entra na parte da milonga é o momento em que a jararaca acuou a vítima, mas quando volta para o baião é para retratar que a vítima escapou.”
“SENTIMENTO”
“Um chamamé que toda vez que toco dá um certo nó na garganta. Ele é lindo, embora seja suspeito para falar. A música é muito triste. Como estou ficando mais velho, estou ficando mais sentimental e chorão. Acabei fazendo essa música pensando em todas as pessoas que já passaram em minha vida. Nela tem o Rodrigo Sater que gravou violão.”
“ROSA DE SAL”
“Essa é uma ‘valse musette’ [tipo de valsa francesa, do séc. 19] na qual tive a alegria de contar com o som do acordeom de Toninho Ferragutti, o homenageado dessa música, tocando com uma afinação tradicional, e eu com uma afinação ‘musette’, uma afinação francesa. Além de nós dois, tem o som do piano de Laércio de Freitas e do baixo de Toninho Porto. Interessante é que na partitura que escrevi nunca teve uma pausa, em um determinado momento, mas todo mundo parava de tocar. Dei uma bronca em todos, mas o Laércio disse: ‘Se a música pediu pausa, a gente tem que fazer´. E ficou com a tal da pausa.”
“FLORETTA”
“Esse é um tango que vira milonga. Compus essa música em parceria com minha filha Flora quando ela estava com três anos. Cada parte dessa música que ela não gostava, porque parava de dançar, ela me olhava feio, dava um tapinha na minha mão. Eu parava e reescrevia até ela gostar. Gravei com meu quarteto de tango. Toquei esse tango em Buenos Aires e todos gostaram. Apesar de não suportarem tangos com outros ritmos, esse eles amaram.”
“NIÉ”
“Essa fiz para o padrinho de minha filha, que se chama Daniel e é percussionista. Ele duvidou que eu fizesse uma música na hora. Fiz esse baião que conta com um coral muito bonito.”
“CORISCO”
“’Corisco’ é um choro que conta com o pandeiro maravilhoso do Guello. Ele mudou a data de uma cirurgia no ombro para poder gravar essa música, porque teria que ficar de molho meses sem tocar. Ficou linda, como todas as outras das quais participa.”
“CAMPOS VERDES”
“Um chamamé um pouco mais alegre, como se estivéssemos em um baile de fronteira. Nele tem um grito sapucai, um grito indígena bem agudo feito pelo Toninho Porto que é de Campo Grande. Quando acabamos de gravar ele ficou superemocionado e chorou muito ouvindo o grito nos lugares certos; sem que eu tivesse dito nada ele acertou em cheio.”
“ARARITANGA DO NONO ALBINO”
“Essa composição é para homenagear meu avô. Ele cantava essa música para mim e para todos os netos. Dedico esse disco aos meus avós, que eram portugueses e italianos. É uma vinhetinha de 15 segundos em que toco dois acordeons.”
SHOW
No show, Romano conta com Marcellus Meirelles, tocando contrabaixo acústico e elétrico; Paulo Ribeiro, no violão; Jabes Felipe, na bateria; e Jorge Cirilo (Ginho), que toca instrumentos de sopro como flauta, pife, sax soprano e sax tenor.
Além das músicas do disco, Romano executa “A Marcha Turca do Mozart”, de sua autoria. “ A gente escuta a ‘Marcha Turca’, do Mozart, mas esquece que ele era austríaco. Então, imagino como se fosse um turco tocando essa peça. Utilizo uma escala turca e indiana e mudei toda a concepção dela. O Mozart deve estar se revirando no caixão”, disse o compositor que promete contar alguns “causos” hilários de sua família, entre uma música e outra.
Assista ao vídeo, a seguir, no qual o artista interpreta um trecho de “Sentimento”, de sua autoria, com exclusividade para o Música em Letras.
SHOW DE LANÇAMENTO DO CD “DA REZA À FESTA”
QUANDO Amanhã, sábado (29), às 20h30
ONDE Teatro da Unibes Cultural, r. Oscar Freire, 2500 – Sumaré, São Paulo, tel. (11) 3065-4333
QUANTO De R$ 15 a R$ 30
CD “DA REZA À FESTA”
ARTISTA Thadeu Romano
GRAVADORA Independente
QUANTO R$ 25