Fabio Torres lança CD “De Cara pro Sol” em show

Carlos Bozzo Junior
Fabio Torres, pianista, compositor e arranjador (Foto: Carlos Bozzo Junior)

Acontece amanhã (21) no Sesc Pompéia, às 21h, o lançamento, com show, do CD “De Cara pro Sol”, do pianista, compositor e arranjador paulistano Fabio Torres.

O Música em Letras esteve ontem (19) na casa do pianista, no Parque Continental, bairro da zona oeste de São Paulo, onde acompanhou o ensaio para o show e gravou com exclusividade “A Menina que Comia Música”, de autoria de Torres, interpretada pelo belíssimo som do violoncelo de Heloísa Meirelles, da flauta de Rodrigo y Castro, acompanhados pelo pianista. A música é uma das 11 do repertório do CD e do show. Veja vídeo no final do texto.

Leia, a seguir, além da entrevista, o faixa a faixa que o músico realizou com exclusividade para o internauta do Música em Letras, comentando cada uma de suas composições.

PIANISTA TARIMBADO

Pianista do Trio Corrente, Torres abocanhou o troféu da 56ª edição do prêmio Grammy, em 2014, de melhor álbum latino de jazz com “Song for Maura”. O disco foi gravado em parceria com o clarinetista, saxofonista e compositor cubano Paquito D’Rivera.

Torres disse que faz diferença ganhar um Grammy. “Quem falar que não está mentindo. Receber um prêmio desses, em uma área competitiva que é a do jazz latino te dá uma projeção; é um selo de qualidade para quem vai conhecer seu trabalho e acaba sendo um chamariz.” Contudo, segundo o músico, a essência musical de seu trabalho não mudou. “Continuo realizando um trabalho de formiga. Eu não me balizo só por ter ganho o prêmio, pois há grandes músicos que nunca ganharam um Grammy. Entretanto, não renego o prêmio, porque ganhei com um trabalho consistente e no qual acredito.”

O primeiro disco autoral de Torres é “Pra Esquecer das Coisas Úteis “ (2009). “De Cara pro Sol” é o segundo disco de sua autoria e nele o músico esbanja amadurecimento técnico como instrumentista e arranjador. Utilizando uma formação camerística em que figuram a flauta de Rodrigo Y Castro, o violoncelo de Heloisa Meirelles e o clarinete de Alexandre Ribeiro, além do contrabaixo acústico de seu companheiro do Trio Corrente Paulo Paulelli e o violão de Marcus Teixeira, o disco é um primor.

Gravado em 2015 e mixado em 2016, o trabalho está sendo lançado somente agora. “A gente tem que parar tudo para fazer um disco como esse. Tive que fazer tudo sozinho e sem apoio financeiro. Fiz a produção executiva, arranjos, composições, além da execução. Todo esse trabalho demanda muita concentração. Às vezes, a vida cotidiana não permite isso, pois temos muitas viagens e família para também nos dedicarmos”, disse o músico que pretende a cada dois anos gravar um disco.

Perguntado se as composições são anteriores a 2015, Torres respondeu: “Composição é assim, a gente vai fazendo e guardando na gaveta. Na hora de gravar o disco, escolhemos qual será gravada, mas também tem aquelas que pintam dias antes da gravação. Por exemplo, quis fazer uma música para minha mulher e isso aconteceu dias antes de gravar. Ela tem uma melodia simples, é bem clara”.

Torres considera “De Cara pro Sol” um disco completamente livre. “Já que ninguém estava pagando para eu fazer o disco, e como foi feito no meu tempo, fiz o que eu quis.”

Na real, Torres tem como hábito passar muito tempo na sala de ensaio de sua casa onde tem um piano Yamaha. Se o músico não está viajando, gravando ou se apresentando, ele está na sala tocando. “É nessas horas que produzo uma melodia técnica, consigo tocar uma coisa que não conseguia e pinta uma composição. Então, esse disco é a materialização desse tempo criativo que passo aqui, mas é claro que procuro uma unidade estética durante o trabalho”, disse o músico que boa parte do tempo se dedica a tocar peças de Chopin, Bach, entre outros clássicos. Prova disso é a inclusão, no novo disco, de dois estudos, “Estudo nº 1” e “Estudo n°2”, que diferem esteticamente das outras composições.

Mostrando o universo desse excelente instrumentista, compositor e arranjador, o disco foi pensado para piano solo, com a presença de outros poucos instrumentos, reforçando a ideia de uma música de câmara feita para pequenas formações. “Quis tirar a sonoridade dessas pequenas formações. Só que teve uma música [“Pra esquecer das Coisas Úteis”] na qual tinha uma ‘voz’ além do arranjo, que eu ouvia o tempo inteiro. Por isso chamei o Alê Ribeiro, um grande instrumentista, para fazer uma participação com clarinete”, falou o músico que no show não poderá contar com Ribeiro e se apresentará em formação de quinteto.

Fabio Torres, pianista, compositor, arranjador e autor do CD “De Cara pro Sol” (Foto: Carlos Bozzo Junior)

SHOW

Além das músicas do CD, duas surpresas constam do repertório do show. “Fiz um arranjo do ‘Venezuelana n°1’, com violoncelo, baixo acústico, piano e flauta, que adorei. Gostei tanto dessa versão, que estou querendo gravá-la e vou apresentar no show. Já havia gravado essa música com o Corrente [Trio] bem suingada com bateria, mas ficou tão bonita nessa formação que vou regravá-la. Algumas músicas que compomos tem fãs bissextos, de vez em quando alguém diz que as ama. Tem outras que todo mundo gosta, que é o caso dessa música. Por isso farei a surpresa de apresentar esse novo arranjo dela no show”, falou o músico que tocará também uma composição de João Bosco. “Gosto de dar um refresco para o público, pois é um show autoral; essa é a única composição que não é minha, mas adoro”, disse sem revelar o nome da música.

Corra para o show e banhe seus ouvidos, coração e alma com ela, pois o arranjo está lindo. Qual é a música? Não revelo. Embora o Música em Letras seja, como Fabio Torres, companheiro da música de qualidade, este blog não vai ter spoiler. Não falo, nem por condução coercitiva. E não tenho dito.

Capa do CD “De Cara pro Sol”, de Fabio Torres (Foto: Carlos Bozzo Junior)

FAIXA A FAIXA, POR FABIO TORRES

“VALSA DE CORA”

“Essa música é dedicada a minha filha [hoje com 4 anos de idade] quando ela ainda estava na barriga da mãe. Essa música encerra o passado e o futuro por ser uma valsa que soa bem antiga, mas dedicada a um bebê que está chegando. É a tradição que se renova.”

“PAQUITO” (Dedicada a Paquito D´Rivera)

“Fiz essa música para ser gravada pelo Paquito no disco ‘Song For Maura’ e o Paquito a gravou de maneira lenta, que ficou linda, mas sempre a imaginei tocando-a rápido. Acabei fazendo essa formação de baixo com violão e a toquei mais rápido. No disco ainda está um pouquinho lenta; no show acho que tocaremos ainda mais rápido.”

“DE CARA PRO SOL”

“Há tempos venho tocando essa música em piano solo. O nome vem dela ser um baiãozinho bem luminoso. Tem música que fazemos triste e outras olhando pra luz, que é o caso dessa, uma música bem aberta. A ideia do disco é de redenção, de coisas que estão por vir. Tecnicamente, ela apresenta uma curiosidade, que aparece também em outras faixas: na mão esquerda tem um piano erudito, que estudo bastante e no qual trabalho a sonoridade, a precisão; na direita, há uma sonoridade livre de pianista de jazz. Tenho desenvolvido bastante esse tipo de interpretação.”

“A MENINA QUE COMIA MÚSICA”

“Essa é um choro canção de tradição brasileira, com uma harmonia moderna que apresenta influência do Guinga [compositor carioca]. Escrevi para esse trio formado por mim, a Helô [violoncelo] e o Rodrigo [flauta], que a tocaram de uma maneira muito linda.”

“VENEZUELANA Nº2”

“Fiz a ‘Venezuelana n°1’, que gravei com o Trio Corrente e tem a mesma forma, mas um caráter diferente. É uma dança e um ritmo que conheci com músicos venezuelanos. Fiz com um compasso em cinco por oito, revezando com um seis por oito, e que às vezes dá um onze, apresentando um desenvolvimento muito interessante. É uma peça meio erudita, mas que não sei classificar muito bem, mas gosto muito dela. Tenho um xodó por essa peça.”

“PASSEIO” (Dedicada a Rosa Passos)

“Essa é uma bossa nova mais para um samba canção muito lento, que tenta recriar a atmosfera que vivi tantas vezes no palco, uma coisa quente, mas ao mesmo tempo contida. É uma balada bem lenta, com um solo lindo do Marcus Teixeira [violão].”

“VOLTA E MEIA”

“Outro baiãozinho bem rápido, que já havia gravado com o Trio Corrente de maneira bem lenta. Quis gravar ela solo, rápido, e acabou ficando uma das músicas mais difíceis do CD, apresentando uma improvisação com uma mão esquerda bem ritmada e que tem uma coordenação entre as mãos para produzir esse ritmo. Dá um trabalhinho, mas gostei da sonoridade dessa faixa.”

“CAROLINE”

“Essa fiz para minha mulher, para agradecer todos os dias que temos de felicidade e de amor dissolvido nas menores coisas vivenciadas por nós.”

“ESTUDO N°1”

“A mão esquerda dessa peça é um encadeamento de poliacordes. São acordes de muitas vozes, bem difíceis, que a mão esquerda arpeja. Essa e o outro estudo são as músicas mais difíceis do CD. Tenho bastante dificuldade em tocá-la, e incluindo ela no show estou tendo que estudar muito para conseguir deixá-la ‘debaixo dos dedos’. Ela tem um caráter erudito, embora com uma harmonia supermoderna. Gostaria de escrever essa música para um pianista erudito tocar e ver o que é que sai disso.”

“PRA ESQUECER DAS COISAS ÚTEIS”

“Essa é um choro canção que adoro e gravei no meu primeiro disco, com letra da Giana Viscardi. Aqui ela aparece em uma versão instrumental, com a ‘voz’ do clarinete do Alê Ribeiro, em um arranjo bem camerístico. Quando regravamos uma música, queremos ouvir uma faceta dela que ainda não conhecemos. Diferentemente de um compositor erudito, que faz uma sinfonia e esgota o aspecto composicional daquela música, o músico popular faz uma versão e depois quer ouvi-la de outra forma. Basta ver quantas regravações são feitas por compositores populares que revisitam a mesma canção várias vezes e acabam por fazer outras versões. Esse músico sou eu, eu sou assim.”

“ESTUDO N°2”

“Essa composição é a mais difícil do CD, tem uma polirritmia e um polimodalismo. Sem improvisação, essa composição está toda escrita e acho uma música muito interessante por ser um desafio. Deixei-a por último por ser a mais árida do disco, por ser polimodal, então harmônica e ritmicamente é bem árida. Se o cara chegar nela é porque gosta de música mesmo.”

Assista o vídeo, a seguir, no qual o artista interpreta “A Menina que Comia Música”, de sua autoria.


SHOW DE LANÇAMENTO DO CD “DE CARA PRO SOL”
QUANDO Amanhã, sexta-feira (21), às 19h
ONDE Teatro do Sesc Pompéia, r. Clélia, 93, São Paulo, tel. (11) 3871-7700
QUANTO De R$ 6 a R$ 20

CD “DE CARA PRO SOL”
ARTISTA Fabio Torres
GRAVADORA Independente
QUANTO R$ 30