Resgatado no Sebo – “Le Petomane”, a música que vinha de dentro

Carlos Bozzo Junior
Livro "Le Petomane" regatado no sebo, em São Paulo (Foto: Carlos Bozzo Junior)
Livro “Le Petomane” resgatado no sebo, em São Paulo (Foto: Carlos Bozzo Junior)

O Música em Letras inicia neste post a série Resgatado no Sebo, com o registro de livros, discos, fitas e objetos relacionados a música garimpados em sebos, ou seja, lojas que comercializam livros e outros itens culturais usados.

Na matéria que abre a série, o destaque vai para o livro “Le Petomane” (1967). A obra, em inglês, conta a história de um homem que fazia música com o ânus.

Seu nome era Joseph Pujol (1857-1945), mas o flatulista- dono do talento de emitir sons ritmados e com melodias por meio de puns- ficou conhecido como uma das maiores bilheterias do cabaré parisiense Moulin Rouge sob a alcunha de “Le Petomane”. O nome artístico era um chiste, referência ao verbo francês “péter” (flatular, peidar, soltar pum).

O francês Pujol desenvolveu o bizarro talento por conseguir puxar o ar para o reto e depois liberá-lo, usando o esfíncter anal a seu bel prazer. O pum vira som quando, ao sair, o ar faz vibrar os músculos que circundam o ânus, conhecido na linguagem acadêmica como esfíncter. Dependendo da pressão que o músculo emprega apertando e relaxando o “furico”, além da velocidade com que o ar é expelido, o som se configura grave, agudo, forte ou fraco.

Entretanto, é errado dizer que o artista Pujol simplesmente “peidava”, pois o que caracteriza um “traque” é a expulsão de gases intestinais pelo ânus, e os emitidos pelo artista, além de terem uma trajetória e origem diferentes, eram completamente isentos de odor.

GÊNESE DA BUFA SONORA

Depois de demonstrar a habilidade de sugar água de uma bacia pelo reto, expelindo-a a metros de distância, enquanto servia o exército em Marselha, onde nasceu, o jovem Pujol experimentou fazer o mesmo com o ar, obtendo sucesso. Antes de se tornar artista Pujol foi padeiro e divertia seus fregueses “peidarolando” melodias e imitando instrumentos musicais em sua padaria.

O “músico”estreou em sua cidade natal, em 1887, antes de passar a exibir seu talento no famoso Moulin Rouge, a partir de 1892. Entre seus números mais famosos em Paris, Pujol apagava velas a distância, imitava trovões, canhões, terremotos e atacava, com seu “som que vinha de dentro”, em músicas como “O Sole Mio” e “Au Clair de la Lune”, além de executar “La Marseillaise”, entre outras. Tudo interpretado com o seu “buraquinho”.

Enquanto artistas como Sarah Bernhardt (1844-1923), considerada a “mais famosa atriz da história”, cobrava 8.000 francos, e o ator Lucien Guitry (1860-1925), 6.500 francos, há informações de que os 20.000 francos que Pujol recebia por espetáculo eram pagos por gente importante. Gente que vinha de todos os cantos do mundo para assisti-lo e quase morrer de rir. Estiveram em seus espetáculos príncipes, reis e o pai da psicanálise, Sigmund Freud (1856-1939).

Contudo, talvez nem o próprio Freud tenha conseguido explicar o porquê de tanta balburdia em torno de um homem que fazia música com o “forévis”. Afinal, todos soltamos puns, até moça bonita. São de 10 a 20 por dia, os “meninos etéreos” liberados por um ser humano, a maioria sem cheiro e sem som. Por isso não nos damos conta do quanto “flatulamos” por aí.

Fotos do livro "Le Petomane", com o artista Joseph Pujol em ação (Foto: Carlos Bozzo Junior)
Fotos do livro “Le Petomane”, com o artista Joseph Pujol em ação (Foto: Carlos Bozzo Junior)

Curioso é descobrir, depois de ler “Le Petomane”, o vasto campo descortinado sobre o assunto que inclui, além desse livro, alguns filmes, com trechos disponibilizados na internet. O próprio Pujol aparece em um deles na url: https://www.youtube.com/watch?v=0rIXipAV6Fs. Uma gravação com ele pode ser ouvida em https://www.youtube.com/watch?v=tixKopGjn5s. O ator italiano Ugo Tognazzi (1922-1990) interpreta Pujol, em “Il Petomane”, na url:https://www.youtube.com/watch?v=z6qvFlgvCgM

Atualmente o flatulista inglês Paul Oldfield interpreta, entre várias músicas, “Smoke On The Water” (1972), da banda inglesa Deep Purple, disponível na url:https://www.youtube.com/watch?v=wzObO4GjcLI e a valsa “Danúbio Azul” (1867), de Johann Strauss II (1825-1899).

O destino de Pujol, relatado no livro, foi no mínimo interessante. Depois de ser demitido do Moulin Rouge, por ter realizado um espetáculo cobrando “apenas” 3.000 francos, para ajudar um amigo em dificuldade, o artista tornou-se proprietário do Théâtre Pompadour, onde se apresentou durante 20 anos, antes de abandonar os palcos e “atacar” como padeiro novamente em Marselha. Mais tarde, o artista abriu uma fábrica de biscuit em Toulon.

Especialista, parece que Pujol nunca queimou a “rosca”, mas fez muito som com ela. Inacreditável, não fosse o registro de um livro Resgatado no Sebo pelo Música em Letras, por apena R$ 3.

O QUE Livro

TÍTULO “Le Petomane” (1967), 63 páginas, fotos e ilustrações em preto e branco

EDITORA Pop Universal/ Souvenir Press

QUANTO R$ 3

ONDE Livraria Sebo Liberdade, Praça Carlos Gomes, 124, Liberdade, São Paulo, tel. (11) 3242-2181

QUANDO De segunda a sexta-feira, das 9h às 20h; sábados e domingos, das 9h, às 18h.