Músicas imortais de Chico, na voz matadora de Zé Luiz Mazziotti

Carlos Bozzo Junior
O cantor Zé Luiz Mazziotti, em seu apartamento (Foto: Carlos Bozzo Junior)
O cantor Zé Luiz Mazziotti, em seu apartamento (Foto: Carlos Bozzo Junior)

É por meio da vibração do ar nas cordas vocais que o ser humano produz um som na laringe chamado voz. A de Zé Luiz Mazziotti, 67, uma das mais bonitas do país, é utilizada para cantar, e muito bem. Mazziotti, que conta com 50 anos de carreira, continua a surpreender com seu timbre e maturidade interpretativa. Experiente, o cantor, compositor e violonista escolheu músicas de Chico Buarque para interpretar em show que acontece amanhã, sábado (28), no Sesc Santo André. O espetáculo tem por base o CD “Canções de Chico Buarque na interpretação de Zé Luiz Mazziotti”, um dos seis discos lançados pelo artista.

O Música em Letras esteve no apartamento em que Mazziotti mora há três anos, na Vila Valparaiso, bairro de Santo André, e entrevistou o cantor que falou sobre seus discos, sua carreira e o show que fará ao lado do pianista Fábio Torres (Trio Corrente) e do guitarrista e violonista Marcus Teixeira. Sobre a beleza de sua voz, Mazziotti esclarece: “Sou um barítono mais para o baixo, porque para ser um barítono mesmo, teria que alcançar mais algumas notas para cima”.

Assista, no final do texto, a dois vídeos nos quais o cantor aparece tocando violão e cantando “Tem mais Samba” e “Mambembe”, ambas no repertório do show.

Mazziotti, que faz show amanhã (28), no Sesc Santo André (Carlos: Bozzo Junior)
Mazziotti, que faz show amanhã (28), no Sesc Santo André (Foto: Carlos Bozzo Junior)

DE RIO CLARO PARA O MUNDO

Mazziotti nasceu em Rio Claro, cidade do interior paulista, mas mudou-se com a família para Campinas, onde viveu por quatro anos antes de vir para São Paulo, aos 7 anos de idade.

Em 1966, o cantor e compositor Eduardo Gudin fazia parte do quarteto vocal Canto 4. Gudin teve que sair do grupo e indicou Mazziotti para seu lugar. “Éramos amigos da casa do Amilton Godoy, do Zimbo Trio, e o Gudin me convidou para participar do grupo cantando e tocando violão”, disse o músico que, com sua voz fazendo “backing” defendeu e classificou “América, América”, música de César Roldão Vieira, e “Boca da Noite”, de Toquinho e Paulo Vanzolini (1924-2013), ambas em 1968, no III FIC (Festival Internacional da Canção Popular) da Rede Globo. Contudo, foi com “São, São Paulo Meu Amor”, de Tom Zé, que o Canto 4 ajudou a abocanhar o 5º lugar (Júri Popular) do IV Festival de Música Popular Brasileira da TV Record. O grupo vocal era formado, além de Mazziotti por Mily, Aquiles (o Véio) e Luiz Bastos. “Eu saí do Canto 4 logo depois disso”, contou o cantor que na ocasião não apreciava a música da Tropicália. “Eu era totalmente Elis Regina e não da Tropicália. Não entendia aquilo. Muitos anos depois é que vim gostar daquilo tudo”, falou Mazziotti que cantou em diversas casas noturnas, de São Paulo como o Jogral, Igrejinha e Flag.

Em 1974, gravou, com arranjo de Cesar Camargo Mariano, a música “Até Quem Sabe”, de João Donato e Lysias Enio, para integrar a trilha da novela da TV Tupi, “Os Inocentes”. “Como sempre fui metido por chamar pessoas de bom gosto, convidei o Cesar Mariano, que fez um arranjo de cordas espetacular para essa música”, contou Mazziotti.

No ano seguinte, o artista mudou-se para o Rio de Janeiro onde permaneceu gravando, na produtora Zurana, uma infinidade de jingles compostos por Tavito, Djavan, Ivan Lins, Marcos Valle e Eduardo Souto Neto, entre outros. Na mesma ocasião, o cantor dividiu palco com vários artistas como Elizeth Cardoso (1920-1990), Ângela Maria, Zezé Gonzaga (1926-2008) e Jamelão (1913-2008).

Mazziotti foi vocalista da cantora Gal Costa durante dois anos. “Chega uma hora que você não tem trabalho e fui fazer vocal para ela, que era minha amiga e com quem já havia gravado”, contou o músico que aparece no disco “Fantasia” (1981) ao lado da cantora interpretando “Estrela, Estrela”, de Vitor Ramil.

O artista perdeu as contas de quantos shows realizou no país e no exterior, pois enquanto morou em Roma e em Paris realizou muitas apresentações pela Europa. “Fui para a Itália em 1984, onde fiquei alguns meses. Retornei para o Brasil e, em 1985, mudei para Paris onde fiquei até 1995”, falou o artista.

Há seis anos Mazziotti é professor da EMESP-Tom Jobim (Escola de Música do Estado de São Paulo) na disciplina de prática de conjunto. “Ensino interpretação”, disse o professor que toda terça-feira, das 9h30 às 20h30, está na instituição que, segundo ele, já revelou talentos como as cantoras Bruna Moraes e Carla Cazarim. “Elas são muito boas. A Bruna canta muito bem e a Carla fez um show, no mês passado, em que ela parecia uma profissional com mais de 20 anos de palco”, disse o orgulhoso professor.

O artista tem seis discos lançados (três LPs e três CDs), além de dois inéditos. São eles: “Zé Luiz” (1979), da gravadora Continental; “Sinais” (1981), independente; “E o Amor Falou” (1984), da Pointer; “José Luiz Mazziotti” (1995), do selo Perfil Musical; “Pra Fugir da Saudade – com Célia” (2002), do selo Jam ; ”Canções de Chico Buarque na interpretação de Zé Luiz Mazziotti” (2004), independente; e os inéditos “Na Itália” (1993) e “Brasileiros” (2007), com o violonista, arranjador e compositor Ezequiel Piaz.

O cantor em entrevista ao Música em Letras (Foto:Carlos Bozzo Junior)
O cantor em entrevista ao Música em Letras (Foto: Carlos Bozzo Junior)

O SHOW

A direção musical do show de Mazziotti, no próximo sábado, é de Marcus Teixeira (violão), que divide arranjos com Fábio Torres (piano) e o próprio Mazziotti. “Faço algumas músicas só de violão e voz”, disse o cantor que deve interpretar pela primeira vez “Fora de Hora”, de Chico Buarque e Dori Caymmi. Além dessa, estão garantidas, apenas com a voz e o violão de Mazziotti, “Samba do Grande Amor”, “Quem te Viu, Quem te Vê”, “Tem mais Samba”, “Maninha”, “Meu Amor”, “Mambembe” e “Bom Tempo”. Com os músicos Fábio Torres e Marcus Teixeira, “Todo Sentimento”, “Fora de Hora” e “Vai Levando”, além de “A Rosa” de Chico e Djavan, entre outras imortais de Chico.

A escolha por gravar um disco só com músicas de Chico Buarque e agora reapresentá-las em show tem uma explicação: “Contei muito com a ajuda do Chico que facilitou a produção do disco em relação aos direitos autorais. Além disso, tenho profunda admiração por ele”, disse o músico que participou da gravação da trilha do filme “Ópera do Malandro”, e do disco “Circo Místico”, cantando o dueto “Opereta do Casamento”, de Chico Buarque e Edu Lobo.

Mazziotti quer que o público compareça a esse show com o “coração aberto”. “Só assim para entender as letras. De coração aberto todo mundo é capaz de vivenciar o que está sendo cantado. O Chico fala o tempo inteiro da alma das pessoas, que podem ser mulheres, homens ou travestis, sempre com um trabalho de poesia muito profundo e abrangente. Até quem não conhece meu trabalho vai curtir por conta da entrega que há nele”, disse o cantor que se emociona muito, mas não perde a estribeira. “O povo é que tem que chorar, não a gente. Às vezes, estou chorando por dentro, mas tenho uma técnica que desenvolvi, com o passar dos anos, que penso em coisas inusitadas como um passarinho, uma mortadela, ou qualquer outra coisa para não estragar a interpretação.”

SHOW ZÉ LUIZ MAZZIOTTI CANTA CHICO BUARQUE

QUANDO Sábado (28), às 20h

ONDE Sesc Santo André, r. Tamarutaca, 302, Vila Guiomar, Santo André, tel. (11) 4469-1200

QUANTO De R$6 a R$20