Casa de músico vira espaço cultural
No último sábado (7), o Música em Letras conferiu o som que aconteceu no espaço de uma casa muito especial em São Paulo: o quintal da Casa da Nina. O som? Música de qualidade realizada pelo duo de guitarristas Michel Leme e Alexandre Mihanovich. O que rolou? Jazz. Se foi bom? O fim da apresentação de uma hora e meia deixou aquela manjada vontade de ouvir mais.
O som chamou a atenção provocando interesse em quem passava do lado de fora da casa. A bancária Dazia Vanessa Eguchi Kemper, 44, é vizinha da Casa da Nina. O Música em Letras presenciou quando ela chegou querendo saber sobre os eventos musicais do espaço. Kemper disse ao blog ter sido atraída ao local pelo som. Era sua primeira vez ali. “Adoro jazz. Fui fazer um acerto na pizzaria ao lado, quando voltei escutei o som e entrei com vontade de ver a cara do lugar.” Quais foram suas impressões? “Achei um ambiente agradável e acolhedor. Era o que eu imaginava. Eu tinha o som, mas não tinha a imagem. Combinou o som e a imagem. Vou voltar, com certeza”, disse sorrindo a vizinha da casa do som.
A NINA DA CASA E A CASA DA NINA
A casa, dona de um simpático quintal, muitas vezes foi usada por seu antigo dono, o contrabaixista Pete Woolley (1939-2006), para ensaios com a cantora Joyce, o pianista Guilherme Vergueiro, o saxofonista Nestico e o trombonista Raul de Souza, entre outros artistas e amigos. Conhecido por ter participado de vários filmes comerciais, Woolley é também figura muito querida no meio musical. Hoje, a casa está sob o comando de uma das ex-mulheres de Pete, Nina, que disponibiliza o local para apresentações de música, vernissages, teatro, circo, exposições e festas .
Nina é o apelido de Rita de Cássia Costa Sprovieri, 57, paulistana da Mooca, que conheceu o contrabaixista Pete Wolley, nos anos 1970, no Café Brasil, no bairro do Bixiga. Ela trabalhava de dublê de garçonete e artista circense no local fazendo acrobacia, mágica, malabarismo e pirofagia (a arte de manipular o fogo), entre um pedido e outro. A temperatura entre Pete e Nina subiu e eles se apaixonaram. “Ele era muito bonito e eu passei a segui-lo. Onde ele tocava eu aparecia”, contou rindo a artista.
Nina revelou que quando mudou para a casa onde funciona a Casa da Nina, Pete não estava casado. “Ele estava namorando uma moça que morava aqui. O Pete quando casava gostava de ter filhos. Teve dois com uma, dois com outra, e sei que quando essa namorada saiu daqui de manhã, eu entrei de noite”, contou Nina que com o músico teve Louise, pianista e compositora conhecida da cena instrumental paulistana. “Como o Pete tinha um monte de filhos, ele resolveu comprar essa casa, em 1978, para morar com eles”, disse Nina referindo-se à prole de Pete formada, na ocasião, por Guzi, Tina, Maia e Guilherme.
A proximidade do imóvel com o famoso point de músicos, o Sanja Jazz Bar, fundado em 1977 com o nome de Chez Bernard, depois Saint Germain, fazia do cafofo de Pete um segundo point de músicos que passavam pela cidade e ali acabavam por realizar pequenas “jam sessions” ou muitas vezes ali se instalavam.
Hoje, a Casa da Nina parece dar continuidade ao que já fora antes, sem pretensão, um local aglutinador de culturas e arte. Atualmente, a cada dois domingos, o espaço abriga cerca de 40 pessoas, entre pais e filhos, que das 10h às 14h, sob a orientação da Companhia Pequeno Circo, montam um espetáculo no final da jornada que mescla circo com teatro. Nele, números com pernas de pau, mágica e malabares enriquecem esquetes e estimulam a interação entre pais e filhos. O adulto paga R$ 10 e a criança, R$ 35. “Participa quem quer, não obrigamos ninguém. Mas é uma coisa muito gostosa, pois as crianças adoram atuar com os pais”, disse Nina que já está aceitando inscrições para essa vivência de circo e teatro para o próximo domingo (15/05).
ALIMENTOS PARA A ALMA E PARA O CORPO
Na Casa da Nina há mais do que alimentos para a alma. Descendente de italianos, é a própria Nina quem prepara algumas gostosuras gastronômicas. Entre elas, bruschettas (R$20) e antepastos (R$15). Este último servido com pão fatiado dá água na boca só de lembrar. A sardela é imbatível, embora a berinjela e a abobrinha também tenham seus valores. Algumas massas e outras opções como pão de queijo, sanduíche de carne louca e milho verde estão no enxuto, mas completo, cardápio, que traz também um saboroso brownie com sorvete (R$15), campeão de audiência entre a criançada. O barman da casa é Tony, o rei da caipirinha, que não raramente interrompe sua função e apresenta o número Adágio Acrobático (dupla acrobática), arrancando aplausos do público. Quanto à frequência, crianças e adultos ficam atentos à música por gosto e respeito.
RESPEITO AO MÚSICO
Falando em respeito, segundo Nina, a proposta da casa é deixar que músicos se apresentem à vontade. “Aqui é um espaço para músicos tocarem o que gostam e do jeito que quiserem”, disse a proprietária, que repassa todo o dinheiro amealhado no couvert (R$20) para os artistas, sem “morder” desse bolo nenhuma fatia.
Nina disse que desde fevereiro, quando abriu o espaço para o público, um pássaro branco pousa todas as manhãs nos galhos das árvores do quintal onde acontecem as apresentações e canta para ela. “Acho que é um sinal de que o Pete está bem contente com o que está acontecendo aqui”, falou.
Casas como a da Nina proporcionam qualidade de vida, com conteúdo, diversão e música boa a quem vive ou está de passagem nessa cidade ensurdecedora. Mesmo sem volume alto, o som que rola nesse quintal é capaz de atrair pessoas para escutá-lo melhor, com atenção, conforto e respeito. Assim, sim. Vida longa à Casa da Nina.
Assista ao vídeo com um trecho da apresentação de Michel Leme e Alexandre Mihanovich na Casa da Nina.
O QUE Casa da Nina
ONDE Rua Itararé, 123, tel. (11) 269 13165. Para maiores informações sobre a programação, envie um e-mail para casadanina1gmail.com ou acesse https://www.facebook.com/casadanina123