Salve a ignorância dos gatos

Carlos Bozzo Junior
Said diante de pios, na loja Ao Gaúcho (Foto: Carlos Bozzo Junior)
Said diante de pios, na loja Ao Gaúcho (Foto: Carlos Bozzo Junior)

O significado do nome Said, de origem árabe, é “feliz”. Assim é o gato que aparece na foto diante dos dois pios de inhambu-chororó. Ele demonstra total indiferença aos artefatos, escondendo qual seria sua escolha entre ambos.

Entretanto o que Said -gato bonito, gordo e bonachão- não esconde é ser bem tratado pelos funcionários e clientes da tradicionalíssima loja de artigos de caça e pesca Ao Gaúcho, estabelecida em São Paulo desde 1925. O local é um dos poucos na cidade que vendem esse tipo de apito, o que Said adoraria saber, mas nem imagina.

Confeccionados em madeira, os artefatos são usados com o intuito de imitar o som de algumas aves para atraí-las. Capivaras também têm seus simulacros sonoros, que outrora serviam apenas para conduzi-las à morte. Até meados dos anos 1960, os pios eram utilizados somente para a caça que, apesar de banida por lei, ainda é praticada às escondidas.

Outra utilização desses apitos é feita por percussionistas e sonoplastas para incrementar o som de músicas ou criar paisagens sonoras. O sopro dos observadores de aves, ornitólogos, fotógrafos e biólogos também circulam pelos espaços interiores desses instrumentos para atrair os animais.

Modelos de pios para atrair inhanbu-chororó (Foto: Carlos Bozzo Junior)
Modelos de pios para atrair inhanbu-chororó (Foto: Carlos Bozzo Junior)

Os pios das fotos custam R$ 115 (tipo bico de pato) e R$ 105 (tipo cruzeta) e são originários da tradicional fábrica de pios de aves Maurílio Coelho, fundada em 1903, em Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito Santo. No site www.piocoelho.com.br é possível ouvir seus sons. Em outras lojas do centro de São Paulo visitadas pelo Música em Letras, os pios estão em falta e têm origem diferente. São de Benedito Novo, Santa Catarina, feitos em uma fábrica de brinquedos e brindes, a New Art do Brasil (www.newartdobrasil.com.br).

Said não tem idéia do que tem “em patas”, mas nem um pio! Deixemos que em sua sábia e divina ignorância ele continue a acreditar “piamente” que esses objetos inanimados de madeira não passam de meros instrumentos musicais. Talvez, por isso, Said seja feliz.