John Patitucci e Brian Blade formam trio com André Marques
Se depender do pianista André Pereira Marques, 39, a máxima “Músico é vagabundo” está definitivamente com seus dias contados.
Professor, arranjador e compositor, o paulistano estuda música há 29 anos. Com Hermeto Pascoal, completou, em janeiro, 21 de convivência, aprendendo, escutando, respeitando, estudando, absorvendo, tocando e retribuindo o mestre com mais música.
A foto que abre este post engana. Marques pouco cruza os braços. Assim como Pascoal, ele trabalha e muito, sem deixar de tratar a música com respeito. São vários seus projetos.
Recentemente gravou e está lançando –fresquinho no mercado- o CD “Plural”, obra do projeto André Marques Sexteto. Nele, o pianista que não cansa de trabalhar mistura o som de seu piano ao do trompete de Diego Garbin; ao trombone de Fábio Oliva; ao contrabaixo de Marcel Bottaro; à guitarra de Guilherme Fanti e à bateria de Fúlvio Moraes.
Outro de seus projetos -em andamento há 11 anos- é a orquestra Vintena Brasileira, com 22 integrantes. O recém-lançado trabalho do grupo liderado por Marques, CD “Bituca”, ganhou aval de criatividade de Milton Nascimento, que considera a obra o que há de mais original em relação ao seu trabalho.
Nem bem finalizou este CD, e o pianista já está compondo três suítes para o próximo trabalho da orquestra. O intuito é trazer algo relacionado à dança contemporânea ou regional, ele ainda não tem certeza. Entretanto, uma coisa ele já sabe: tanto música quanto dança terão a mesma importância, o mesmo tratamento. “Vou misturar os dois. Geralmente em espetáculos de dança, músicos ficam em segundo plano. Às vezes, nem ficam no palco”, adiantou o compositor, em entrevista concedida ao Música em Letras.
Em trios, atua em dois. Primeiro, no Curupira, compondo e arranjando, além de tocar piano, teclado, flauta, escaleta e rabeca, ao lado de Fábio Gouveia (baixo, guitarra e flauta) e Cleber Almeida (bateria, percussão, viola e flauta). O outro trio é “só para aquecer”, falou.
REVERÊNCIA
Como professor, Marques é super respeitado onde ensina. No conservatório de Tatuí, no interior do estado, na faculdade Souza Lima, em São Paulo e “quando sobra tempo, dou aulas particulares”, disse.
Com o grupo de Hermeto Pascoal, toca pelo Brasil e pelo mundo. E foi em uma dessas viagens, passando pela França, que o pianista conheceu o baixista John Patitucci e o baterista Brian Blade, integrantes, ao lado do pianista Danilo Perez, do Wayne Shorter Quartet. “O Hermeto conhece o Wayne Shorter (compositor e saxofonista norte-americano). Como chegamos um dia antes de nosso show, pudemos assistir o dele. Quando acabou, acompanhei Hermeto no camarim e fiquei espantado com tanta reverência que renderam a ele”, disse o discípulo de Pascoal, afirmando que todos os músicos presentes, inclusive Shorter, curvaram-se diante do mestre alagoano em um gesto de profundo respeito.
O encontro plantou na cabeça de Marques a semente de uma ideia: gravar com eles a música de Hermeto Pascoal. “Pensei em realizar uma sonoridade diferente do que já foi gravado e feito com a música do Hermeto”, falou o pianista.
A semente foi cuidada por Rogério Boccato, percussionista brasileiro que há muito reside em Nova York e conhece o baixista John Patitucci, além do baterista Brian Blade. Falou com eles. Aceitaram. O percussionista assumiu a produção executiva até a parte do estúdio. Marques enviou um arquivo com uma guia de piano e as partituras, semanas antes de embarcar para os Estados Unidos. Em novembro passado, gravaram em um dia e mixaram no outro. O disco está pronto. É só fazer a capa e enviar para a fábrica.
MÚSICAS
A maioria das músicas são conhecidas como “O Ovo”, “Bebê”, “Chorinho pra Ele” e “Tacho”. Outras nem tanto, como “Coalhada”, “Menina Ilza”, “Boiada”, “Das Nuvens e do Chão”, são conhecidas mais por quem acompanha a rica produção de Hermeto Pascoal. Menos conhecida é “Na Guaribada da Noite”, com um arranjo do Hermeto, que foi adaptado para o trio. Esta nunca foi gravada, só quem é fã conhece. Pascoal gostou e aprovou a ideia.
No grupo do Hermeto Pascoal, em apenas uma música costuma se ouvir a mistura de três a quatro ritmos diferentes, mas sempre respeitando a linguagem de cada um deles. Tudo em meio a uma harmonia doida, que foge do convencional e preserva intactas da “loucura louca” melodias originais. Pode até parecer nome de doença, mas não. Tanta “polirritimia com contrapontos” é capaz de sarar qualquer ouvido doente ou carente de música de qualidade. Nas músicas há improvisos, mas os arranjos ganham maior importância. No grupo a música é voltada, para a banda, e não apenas para o indivíduo que a executa. O som é coletivo, da turma, de todos, para todos. Quase beirando a filosofia budista.
No disco novo, ainda sem nome, a coisa é bem diferente. Munidos apenas das melodias e das cifras, John Patitucci, Brian Blade e André Marques realizaram uma música mais livre, com mais improvisações, sem muitos arranjos, o que normalmente predomina no trabalho do bruxo Pascoal.
GRANA
Anteriormente, Marques tentou emplacar este projeto, com um custo em torno de R$30 a R$40 mil, em dois editais: no ProAc (Programa de Ação Cultural do Governo do Estado de São Paulo) e no da empresa Natura, mas em ambos foi recusado.
Buscando apoio, o pianista fechou parceria com a gravadora Borandá que, além de fazer uma tiragem inicial de dois mil a três mil discos, pretende tê-los prontos até o final de maio para distribuir em junho e fazer shows de lançamento em agosto, com a presença dos gringos. “Estamos trabalhando muito para isto”, disse Marques.
Duvido, músico é vagabundo!